
China: governo chinês celebrou o aniversário de 70 anos da sua revolução e de domínio do Partido Comunista (Kevin Frayer/Getty Images)
Por Domingos Leonelli*
Os socialismos dos séculos XX e XXI são muitos diferentes entre si e resultam de realidades e processos revolucionários dos mais diversos.
Desde o meteórico socialismo soviético que começou e terminou no século XX, até o da pequena Cuba que começou no século XX e resiste até os dias de hoje, embora cercado e bloqueado pelos EUA.
O mais bem sucedido é, exatamente, o mais marcado por uma especificidade nacional e que levou a China a se constituir num dos países lideres da revolução tecnológica, da economia do conhecimento e da economia criativa.
A capacidade do socialismo chinês de se reinventar é que lhe possibilita ser considerado um exemplo bem sucedido de Socialismo Criativo.
O atual socialismo de mercado ou “socialismo com características chinesas” realizou tarefas gigantescas, dentre elas a de tirar 800 milhões da pobreza em menos de 70 anos, ou seja 11 milhões e meio por ano. O Brasil, no seu maior esforço em tarefa semelhante durante 12 anos dos governos Lula e Dilma, conseguiu o meritório feito de retirar três milhões por ano.
Além de regimes políticos e econômicos distintos – um socialista e outro capitalista – a diferença é que a China fez uma revolução e a partir dela projetos estruturais de combate à pobreza. E o Brasil nem a revolução democrático-burguesa iniciada por Getúlio Vargas nas décadas de 40 e 50 conseguiu completar.
Aliás, a China, na verdade fez três revoluções: a de 1949 resultante da Grande Marcha, a revolução cultural, ambas dirigidas por Mao Tsé-Tung, e a Reforma iniciada em 1978 liderada por Deng Xiaoping e seus anciãos, Chen Yun, Bo Yibo, Peng Zhen, Yang Shangkun e outros, os “8 Imortais”, como registra Perry Anderson no seu livro Duas Revoluções.
Embora diferentes e até mesmo contraditórias entre si essas revoluções tiveram uma mesma marca comum: o espírito revolucionário, a extrema fidelidade ao povo, e a vontade férrea de dirigentes políticos profundamente comprometidos com o projeto nacional de desenvolvimento. Ainda segundo Anderson, os dirigentes da reforma de 78 “eram de têmpera leninista: radicais, disciplinados, criativos, capazes a um só tempo de paciência tática e de experimentação cautelosa, das iniciativas mais ousadas e das guinadas mais dramáticas. E foi com esse espírito que eles enfrentaram o impasse que a revolução cultural lançara o País”.
Em 1º de Outubro de 2019 a revolução chinesa completou 70 anos, dois a menos que o Partido Socialista Brasileiro, e a China dirigida por Xi Jinping apresenta ao mundo a estação espacial Tiangong, o maior rádio telescópico esférico do mundo, o satélite de comunicação quântica Mozi, além de engenhos militares e mísseis de longo alcance, resultados também do salto tecnológico da indústria chinesa.
A segunda economia do mundo continua com uma das maiores taxas de crescimento (6,6%), tendo saído de um PIB de 150 bilhões de dólares em 1978 para 12 trilhões em 2018. Mesmo tendo reduzido sua taxa de crescimento que chegou a 14% ao ano, a China deverá ser a primeira economia do planeta em 2030. Milagre? Não. A presença constante de um sentido de revolução.
Elias Jabbour e Gonzaga Belluzzo nos ajudam a decifrar esse novo tipo de socialismo e essa explosão de progresso com o artigo intitulado “Quando o Socialismo Fabrica o Mercado”. A China, ainda segundo Jabour e Belluzzo, ousa se reinventar a cada instante, e está “suscitando a emergência de uma nova, complexa e inovadora experiência econômica social”. Uma nova formação econômica social onde, por exemplo, um simples banco de desenvolvimento municipal de Shangai foi responsável por 50% do investimento em 300 km de metrô.
Além da economia, a China persegue hoje outro grande objetivo: “O de construir a cultura de legalidade socialista, e estabelecer o conceito do estado de direito caracterizado pela supremacia da constituição e das demais leis e pela igualdade de todos perante a lei” conforme afirma o relatório do 19º Congresso do Partido Comunista Chinês.
Este objetivo da Revolução Chinesa corresponde ao preenchimento de uma das grandes lacunas do socialismo mundial: construir um estado de direito democrático socialista, apesar do percalços de Hong-Kong.
* Presidente do Instituto Pensar e coordenador do site Socialismo Criativo