Para quem mora em bairros periféricos como Barra do Ceará, em Fortaleza, o home office é ficção

A população pobre que vive nas periferias brasileiras tem sofrido um pouco a mais frente a pandemia da Covid-19. Pesquisas realizada pelo grupo Ação Covid-19 aponta que a desigualdade eleva a letalidade da doença em favelas por questões como renda e baixo, ou nenhum, acesso a saneamento.
É o que acontece, por exemplo, com a diarista Joceliane Gomes Santos de Freitas que, segundo conta a alemã DW, quase todos os dias, com ou sem pandemia a diarista sai de casa às 7h em Barra do Ceará, comunidade de Fortaleza, para trabalhar.
Joceliane caminha por uma hora até chegar ao trabalho: “é preciso economizar com a condução”, diz ela, que mora com o marido e os dois filhos de 4 e 8 anos.
Em abril, o marido dela estava desempregado há três anos encontrou um emprego, e agora trabalha como porteiro das 18h às 6h. Sem creche, quem cuida dos filhos é a mãe dela, idosa, que semanalmente sai de outro município para isso.
A casa de três cômodos não tem água encanada e uma bica no quintal abastece a família. O álcool em gel e os produtos de limpeza são garantidos por doações.
Home office ficcional
Para quem mora em bairros como Barra do Ceará, o home office e a quarentena são ficções. E o auxílio de R$ 600 pago a Freitas pelo governo federal não permite que ela deixe o trabalho. “A gente tem medo de pegar coronavírus, mas tem que buscar o alimento.”
Fortaleza, uma das capitais mais desiguais do país, tem o segundo maior índice de infectados com coronavírus por 100 mil habitantes. Lá, assim como em outras periferias do Brasil, a pandemia escancarou a disparidade socioeconômica e o quanto quem vive em locais de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) tem mais chances de se infectar e morrer.
Conforme dados obtidos pelo DW Brasil, no bairro Meireles, área nobre de Fortaleza com IDH próximo da Noruega, em que o nível de confinamento é de 70% (meta estadual), a taxa de infectados é de 6%, e a de letalidade, de 0,5%.
Por outro lado, diz o estudo, se Barra do Ceará, com IDH inferior a países como o Sudão do Sul, tivesse o mesmo nível de isolamento a taxa de infectados seria de 16%, e a letalidade triplicaria.
Em Barra do Ceará a necessidade de confinamento calculada é de 86%, sendo que a comunidade alcançou apenas 50%. Isso mostra que o coronavírus avança mais rapidamente sobre as comunidades carentes e com maior letalidade.
Mortes
Os números oficiais, mesmo considerando a subnotificação, já dão uma noção da diferença. Barra do Ceará, de 1º de abril até 26 de maio, registrou 400 casos de coronavírus e 58 mortes, ou uma taxa de mortalidade de 14,5%, enquanto em Meireles houve 649 casos e 27 vítimas, ou uma mortalidade de 4,2% nesse período.
Rio
Outra comparação que revela a disparidade está em Copacabana, Rio. Para achatar a curva de infectados no bairro carioca, os pesquisadores estimam que o confinamento teria de ser aumentado da meta de 70% para ao menos 80%. Ocorre que lá, está a comunidade Pavão-Pavãozinho, onde o índice ideal seria de 92%.
“O nível de confinamento social é muito difícil para esses territórios, até a noção de casa é diferente, a rua muitas vezes faz parte da casa. O que tem de ser feito é diminuir a chance de transmissão de pessoa para pessoa, dar condições para as pessoas não se contaminarem, ter equipamento individual, renda, porque as pessoas estão saindo de casa para trabalhar”, afirma o economista José Paulo Guedes Pinto, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), que faz parte do grupo Ação Covid-19.
Acesse AQUI o site do grupo Ação Covid-19 para conhecer o estudo completo.
Com informações da DW (Deutsche Welle).