
Com 100% das urnas apuradas, o candidato de esquerda Pedro Castillo, do partido Peru Livre, vence o segundo turno das eleições presidenciais do Peru. Ele teve 50,125% dos votos válidos, contra 49,875% da ultradireitista Keiko Fujimori, do Força Popular. O presidente eleito recebeu três de cada quatro votos nos dez estados mais pobres do país. Após o fechamento das atas contabilizadas, Castillo agradeceu ao povo peruano pela “confiança” e disse que seu governo será “devido a todos os cidadãos”. A apuração dos votos levou mais de duas semanas para ser concluída.
“Um novo tempo começou. Milhões de peruanos (as) se levantaram em defesa de sua dignidade e justiça. Agradeço aos povos de todo o Peru que, por sua diversidade e força histórica, confiaram em mim. Meu governo será devido a todos os cidadãos”, afirmou no Twitter.
A vitória de Castillo representa a chegada das forças progressistas ao poder peruano e o fim de um impasse político no país, que teve quatro chefes de Estado nos últimos três anos. O presidente eleito assume o cargo no dia 28 de julho.
Fujimori venceu em Lima
Fujimori venceu com folga em Lima, região mais rica do Peru. A ultradireitista tentou anular 200 mil votos – a maioria no sul do país, onde Castillo foi vitorioso.
Sem provas, Keiko chegou a falar em fraudes e irregularidades eleitorais durante o segundo turno, declaração que foi rejeitada pelo Júri Eleitoral Nacional (JNE) do Peru e comissões de observadores internacionais que acompanharam o pleito. A Missão de Observação da União Interamericana de Organizações Eleitorais (Uniore) indicou que as eleições foram bem-sucedidas e reconheceu todo o processo eleitoral.
No final da semana passada, a totalidade das atas, que equivale aos boletins de urna, já havia sido processada. Porém, não haviam sido, ainda, contabilizados todos os votos que continham nelas, o que foi concluído apenas nesta terça-feira (15).
Apuração paralela já indicava vitória de Castillo
Castillo já havia se declarado vencedor das eleições presidenciais do Peru, na última terça-feira (8), com base na porcentagem de apuração e nas contagens paralelas realizadas pelo Peru Livre. Aos seus apoiadores, o sindicalista de 51 anos declarou que o “povo falou” e pediu que os eleitores não “caiam em provocações”.
Desde domingo (6), a apuração caminhou a passos lentos, principalmente por conta das atas do exterior – que precisaram, em alguns casos, vir ao Peru por via aérea. Castillo começou a contagem de votos cerca de seis pontos percentuais atrás da filha do ex-ditador Alberto Fujimori, ainda na madrugada de segunda-feira (7), domingo à noite no Peru. A virada aconteceu somente com 92,62% das atas contabilizadas.
Longa apuração
Ao longo do processo de apuração, os votos que ainda faltavam ser apurados eram de regiões onde Castillo era mais forte – caso de Cusco, por exemplo, onde o candidato do Peru Livre angariou votos na proporção de 8 para 2. Às 12h44 desta quarta-feira, a região havia alcançado pouco mais de 95% das urnas apuradas.
Por sua vez, as áreas onde Keiko conquistava maior popularidade já estavam com a apuração muito avançada. Lima, por exemplo, onde a candidata de extrema direita possui uma ampla base de eleitores, está com 100% das atas processadas e 97,96% contabilizadas.
Existe uma diferença entre atas processadas e atas contabilizadas. As processadas são as recebidas pelo órgão eleitoral e checadas quanto à validade; as contabilizadas são aquelas que, efetivamente, entram na contagem dos votos.
A esperança da direitista para uma nova virada eram os votos do exterior, que vinham em grande proporção a favor da candidata. Mesmo assim, à medida em que a apuração avançou, essa proporção, que chegava a ser de 80 votos para Keiko e 20 para Castillo a cada 100, caiu durante a apuração para 66 contra 34.
Pedro Castillo
Professor e sindicalista peruano, Castillo ganhou reconhecimento nacional em 2017, quando encabeçou uma greve de profissionais da educação do país. Ainda jovem, o presidente eleito fazia parte de rondas campesinas, organizações que combatiam crimes que ocorriam nas zonas rurais do Peru, o que, ainda hoje, representa em suas caminhadas ao usar chapéu característico aos integrantes destes grupos.
Após o primeiro turno, no qual Castillo saiu como vitorioso com 18,92%, o esquerdista caminhou na liderança de diversas pesquisas de intenção de votos. A primeira delas chegou a dar 20 pontos de vantagem de Castillo sobre Keiko.
Presidente marxista
Eleito pelo partido Peru Livre, uma sigla que se define como “marxista-leninista-mariateguista”, a organização defende reformas “totais” em relação à política fiscal e tributária peruana e propõe a “nacionalização dos recursos estratégicos” da nação.
Em sua campanha eleitoral, o então candidato falou em participação popular e na convocação de uma Constituinte no Peru. Castillo defende que a atual Constituição prioriza o interesse privado sobre o interesse público, o lucro sobre a vida e a dignidade. Para ele, a ideia é permitir que os peruanos decidam “democraticamente” se querem ou não uma nova Carta Magna.
Com propostas de esquerda voltadas para a classe trabalhadora e concorrendo em um partido que se identifica como marxista, o presidente eleito do Peru, Pedro Castillo, venceu o 2º turno das eleições presidenciais e foi o mais votado em nove das dez regiões mais pobres do país. Três em cada quatro votos deste grupo de departamentos (o equivalente aos Estados) foram para o candidato do Peru Livre.
Mais vulneráveis votaram em Castillo em peso
Em Huancavelica, o departamento com o IDH mais baixo do Peru, o presidente eleito obteve uma das votações mais expressivas das eleições de 2021: recebeu 84,85% dos votos contra 15,14% da filha do ex-ditador Alberto Fujimori. Em números de votos, a diferença fica ainda mais evidente, pois Castillo conquistou 136.255 votos a mais do que Keiko.
Os dados apresentados neste texto foram colhidos por Opera Mundi no dia 10, quando a apuração alcançava mais de 98%. Outros quatro departamentos que estão entre os mais pobres – Huánuco, Ayacucho, Madre de Dios e Amazonas – também merecem destaque, já que em todos eles, Keiko Fujimori havia sido a mais votada nas últimas eleições presidenciais, em 2016.
A candidata de extrema direita, vale destacar que ela venceu em cinco dos dez mais pobres em 2016, mas conseguiu vencer em apenas um desses distritos nas eleições de 2021. 65,8% dos eleitores do departamento de Tumbles votaram em Keiko no pleito deste ano, superando os 34% conquistados por Castillo.
Mais ricos também escolheram Castillo
Embora a votação de Castillo tenha sido muito expressiva nos departamentos mais pobres, fator que contribui para sua vitória a nível nacional, entre as regiões mais ricas o candidato de esquerda também teve bom desempenho e conseguiu vencer em seis dos dez distritos com o IDH mais elevado do país.
Arequipa, Junín, Cusco, Ancash, San Martín e Pasco entregaram mais votos ao novo presidente do que à filha do ex-ditador Fujimori. Entre essas regiões, Cusco merece destaque, por se tratar de uma das maiores regiões rurais do país e que, como era avaliado inclusive pela campanha de Castillo, era o departamento onde o Peru Livre poderia ter melhor desempenho. O departamento deu ao novo presidente 82,2% dos seus votos, 482 mil a mais do que Keiko recebeu.
No departamento de Arequipa que, além de ser o 2º mais populoso tem o segundo maior IDH do Peru, Castillo venceu com uma margem de 254 mil votos de diferença, tendo recebido 64,8%.
Com informações de Opera Mundi