
Na terra de ninguém chamada internet um novo universo se mostra especialmente perigoso para as crianças: a realidade virtual – ou metaverso.
Uma pesquisadora da BBC News entrou no aplicativo VRChat uma plataforma virtual online que os usuários podem explorar com avatares 3D.
Sem nenhum tipo de verificação para além de ser usuário do Facebook, ela se passou facilmente por uma menina de 13 anos.
Ela criou um perfil falso para configurar sua conta — e sua identidade real não foi verificada. A partir daí, assédio e situações com teor sexual, racismo e ameaça de estupro entraram em cena.
O metaverso pode ser acessado com óculos de realidade virtual. O Oculus Quest – que agora leva a marca Meta Quest – pertencente ao Facebook, tem até 75% da participação de mercado.
Foi um desses aparelhos que a pesquisadora da BBC News usou para entrar no VRChat.
Crianças e adultos no metaverso
A pesquisadora conta que dentro do VRChat, existem diversas salas onde os usuários podem se encontrar: de lanchonetes a clubes de strip-tease. Em todos os locais, as crianças circulam livremente ao lado de adultos.
Foi em uma dessas salas que a pesquisadora da BBC foi abordada por um homem que disse a ela que os avatares “podem tirar a roupa e fazer coisas impublicáveis”.
A BBC News também conversou com um ativista do campo da segurança online que passou meses investigando o VRChat. Ele também prefere não revelar seu nome por motivos de segurança.
Ele também conversou com crianças que utilizam a plataforma. Recebeu relatos estarrecedores de sexo em grupo virtual que elas foram forçadas a participar.
De acordo com ele, a realidade virtual é tão intensa que as crianças representam os movimentos sexuais.
Falta de supervisão e negligência
Para Andy Burrows, chefe para políticas de segurança infantil online da Sociedade Nacional para a Prevenção da Crueldade contra Crianças (NSPCC, na sigla em inglês), no Reino Unido, afirmou que se trata de “uma combinação tóxica de riscos” e que alguns aplicativos no metaverso têm uma “natureza perigosa”.
A instituição se disse “chocada e irritada” com as descobertas da pesquisadora da BBC.
“Este é um produto que tem uma natureza perigosa, por causa da falta de supervisão e por negligência. Estamos vendo produtos sendo lançados sem considerações sobre a segurança” para os usuários, disse ele.
A Meta afirmou à BBC que oferece ferramentas que permitem aos jogadores bloquear outros usuários. E que procura fazer melhorias de segurança “à medida que aprende como as pessoas interagem nesses espaços”.
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Leia o relato da pesquisadora da BBC sobre o Metaverso
Minha experiência no VRChat
Eu fiquei surpresa como você fica totalmente imersa nesses espaços. Me senti uma criança de novo. Quando homens adultos perguntavam por que eu não estava na escola e me encorajavam a participar de atos sexuais na realidade virtual, tudo pareceu mais perturbador.
O VRChat definitivamente parecia mais um playground para adultos do que para crianças. Muitos dos quartos tinham uma decoração de atmosfera erótica, em neon rosa, algo parecido com o que você vê no Bairro da Luz Vermelha em Amsterdã ou nas partes mais decadentes do Soho de Londres à noite. No interior do quarto, era possível avistar brinquedos eróticos.
A música que toca nas salas, que pode ser escolhida pelos jogadores, aumenta a impressão de que esse não é um espaço próprio para crianças.
Tudo nos quartos era inquietante. Havia avatares que simulavam sexo grupal no chão, falando uns com os outros como crianças fingindo ser casais adultos.
É muito desconfortável, e as opções são ficar e assistir, passar para outra sala onde haverá algo semelhante ou então participar — o que, em muitas ocasiões, fui instruída a fazer.