
O empresário bolsonarista Luciano Hang, em depoimento nesta quarta-feira (29) na CPI da Pandemia no Senado, protagonizou um espetáculo de deboche e negacionismo. Ele chegou a classificar as medidas de prevenção ao coronavírus como “idiotice”.
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A declaração sem lastro na ciência do dono da rede varejista Havan veio após o relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), questionar o fato de Hang usar as redes sociais para atacar as medidas não farmacológicas (lockdown, distanciamento e uso máscara) de combate ao coronavírus.
“A sua empresa atua no ramo de saúde?”, perguntou Calheiros. “Não”, respondeu de maneira ríspida Luciano Hang. “Mas as suas redes estão repletas de manifestações contra as medidas não farmacológicas de manejo da Covid-19, desconfiança contra a vacina e a favor do tratamento preventivo e precoce. O senhor não acha essas manifestações, de alguma maneira, criminosas? Porque o senhor faz ataques tão veementes contra as medidas não farmacológicas de contenção da Covid-19?”, perguntou Renan Calheiros.
“Eu nunca vi tanta idiotice como fizeram nessa pandemia. Reduziram o horário de atendimento das lojas. Tinha cidade que ficava 2 horas aberta, reduziram o horário ide ônibus, pararam de funcionar nos domingos e feriados, fizeram o contrário, não tem lógica o que fez o gestor público nesse país. Na minha cidade, onde moro, foi uma das que menos fechou no Brasil o número de morte por habitante é 2 mil, a letalidade é 1.1. Nós trabalhamos direto em Brusque (SC). Paramos quinze dias em 2020 e nem por isso aumentou o número de mortes”, respondeu o empresário sem citar a fonte dos dados.
Em seguida, Hang adotou o discurso defendido pele presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e atacou os governadores que adotaram medidas não farmacológicas para conter o vírus. “O que notei é que prefeitos e governadores utilizaram politicamente o vírus. Lamentável. As cidades que mais fecharam, eu vi ontem, 4 mil mortes por 1 milhão. O estado de São Paulo aumentou a média de mortes… quero mandar um abraço e um parabéns pro governador…”, disse Hang sem especificar para quem era o abraço.
Tumulto e interrupção
A primeira parte do depoimento de Hang à CPI foi tumultuada. Diversas interrupções, de senadores favoráveis e contrários ao governo, marcaram a oitiva, desde a intervenção inicial do depoente às primeiras perguntas do relator, senador Renan Calheiros.
O empresário é acusado de pertencer ao chamado “gabinete paralelo”, grupo que atuou informalmente junto ao Ministério da Saúde nas decisões relacionadas ao combate à pandemia. Esse grupo é acusado de contribuir para a disseminação de fake news sobre a doença, de promover tratamentos sem comprovação científica e defender a “imunidade de rebanho” em detrimento do distanciamento social e da vacinação em massa.
Em sua fala inicial, Hang rejeitou a pecha de “negacionista” e disse ser favorável à vacina. Afirmou que a CPI desrespeitou a memória de sua mãe, Regina, que morreu de covid em fevereiro, em hospital da empresa Prevent Senior, investigada pela comissão.
O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), negou ter havido desrespeito e observou que foi o próprio depoente o primeiro a mencionar a morte da mãe nas redes sociais, para defender o controvertido “tratamento precoce” contra o coronavírus.
Respondendo às perguntas iniciais de Renan Calheiros, Luciano Hang admitiu possuir contas no exterior e empresas offshore, ressalvando que todas estão declaradas à Receita Federal. Perguntado se recebeu benefícios fiscais, Hang disse que a Havan tem negócios em quase todo o país, e que em alguns estados e municípios sua empresa faz jus a benefícios por lei.
Hang negou ter recebido financiamento de instituições públicas, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O empresário reconheceu, no entanto, ter recorrido à Agência Especial de Financiamento Industrial (Finame), subsidiária do BNDES, para comprar máquinas.
“Na pandemia, bancos estatais chegaram a oferecer dinheiro para mim. Peguei do Bradesco, do Itaú, do Santander. Me ofereceram de outros bancos. Eu disse: ‘Na-na-ni-na-não’. Eu não vou pegar dinheiro de nenhum banco estatal, sob pena de lá na frente dizerem: ‘Olha só. Está sendo financiado com dinheiro público. Foi para isso que ele apoiou o presidente’. Não peguei um centavo”, afirmou.
Ao longo de toda a oitiva, senadores se queixaram do andamento dos trabalhos. Os opositores ao governo acusaram Hang de fazer propaganda de suas empresas e dar respostas sem relação com o objeto da CPI. Os governistas, como os senadores Marcos Rogério (DEM-RO), Jorginho Mello (PL-SC) e Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), acusaram o relator de ofender o depoente, ao fazer uma referência a “bobos da corte” que cortejam os poderosos; de cercear o direito de Hang responder como entendesse apropriado; e de fazer perguntas sem relação com a investigação.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) declarou ter sido ofendido por um dos dois advogados de Hang. Depois de prolongada discussão, o presidente da CPI, Omar Aziz, decidiu pela retirada do advogado e suspendeu a sessão.
“O momento é de muita cautela, porque sabíamos que isso ia acontecer”, concluiu Omar, referindo-se à tumultuada oitiva.
Com informações da Agência Senado e da Revista Fórum