
Podem falar o que quiser, mas a morte do Lázaro de Cocalzinho é uma tragédia sob qualquer ponto de vista que se olhe. Não há nada a comemorar nesse episódio lamentável que serviu apenas para mostrar o quão bárbaros ainda somos, e o quanto o Estado é incompetente e violador das garantias mínimas da cidadania.
Sim, amantes do gatilho e das bravatas de Bolsonaro e companhia, em uma sociedade civilizada, até mesmo bandidos têm direitos. As cenas dos PMs goianos jogando o corpo inerte do criminoso na ambulância do corpo de bombeiros é uma das imagens mais deploráveis que vi em toda a minha vida (e olha que já vi coisa feia). Não é admissível achar que esse tipo de atitude é normal em uma instituição estatal cuja atribuição é proteger, respeitando as prerrogativas cidadãs.
Aliás, não aceito qualquer comentário de que bandido bom é bandido morto etc. Não compactuo com esse tipo de visão. Muito menos estou aqui para canonizar Lázaros e assemelhados e relativizar seus crimes hediondos. A questão é apenas não admitir que o Estado, sobretudo o Estado Democrático, possa, a pretexto de combater a barbárie, ser tão ou mais bárbaro do que o objeto de sua ação.
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Caso Lázaro remete a Lampião
O corpo destruído e inerte de Lázaro, me remeteu à terrível imagem de Lampião e seu bando, após sua captura pela volante que os arrebatou no sertão sergipano. As cabeças disformes, cuidadosamente expostas em uma escadaria junto com alguns de seus pertences, pela polícia, cujos integrantes não cabiam dentro de seu orgulho assassino.
Vejo declarações deploráveis do presidente da República, de governadores de Estado e dirigentes de instituições públicas que comemoram a morte do criminoso como se tivessem vencido uma guerra impossível. Todos, ou quase todos, irmanados com a desumanidade e sedentos por colher os frutos políticos de uma plantação apodrecida e envenenada desde sua origem e por seus próprios fundamentos.
Lampião e seu bando foram mortos há quase 83 anos, em 28 de julho de 1938. Lázaro, hoje, 28 de junho de 2021. Nesse longo período o que separa os dois tristes eventos, não evoluímos nada.
O Estado, suas instituições responsáveis pela segurança, continuam com práticas falhas, vacilantes. E seus membros, ao menos parte deles, movidos pelo mesmo instinto animalesco e incivilizado de antes.
PS: A forma como boa parte da imprensa cobriu esse episódio é igualmente deplorável.
* Luiz Gustavo Rabelo é jornalista e bacharel em Direito, pós-graduado em Direito Público