
Setor que tradicionalmente recebe atenção especial do governo por conta do valor agregado à economia e do impacto sobre o emprego, a indústria automotiva foi beneficiada com R$ 69,1 bilhões em incentivos fiscais da União entre 2000 e 2021, em valores corrigidos pela inflação.
Levantamento feito pela Folha a partir de dados da Receita Federal mostra que, embora tenha um número reduzido de empresas em atuação no país, o setor aparece na lista dos maiores gastos tributários do governo federal.
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Essas empresas ganham descontos em Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto sobre Importação. Fábricas instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste contam com tratamento especial e ampliam os benefícios.
Para este ano, a conta estimada de incentivos federais para o setor automotivo está em R$ 5,9 bilhões, cerca de 2% de todos os benefícios concedidos pelo governo. O valor seria suficiente, por exemplo, para pagar mais uma parcela de R$ 300 do auxílio emergencial a aproximadamente 20 milhões de pessoas.
Gastos tributários
Em 2021, o governo estima que o total do chamado gasto tributário — quando abre mão de receber algum imposto ou contribuição —, será de R$ 307,9 bilhões. Quase um quarto desse volume diz respeito ao Simples Nacional, programa que simplifica e reduz a cobrança para mais de 12 milhões de pequenas empresas.
Na lista de benefícios concedidos pelo governo federal e que são maiores do que os do setor automotivo, também aparecem a agricultura e agroindústria, setor altamente pulverizado, com R$ 32,7 bilhões em benefícios em 2021, ou 11% do total.
Logo abaixo, estão entidades sem fins lucrativos (R$ 29,3 bilhões), a Zona Franca de Manaus (R$ 24,2 bilhões), medicamentos e equipamentos médicos (R$ 14,4 bilhões) e a área de informática e automação (R$ 6,6 bilhões).
Além da ajuda federal, as montadoras também recebem benefícios dos governos regionais. Na guerra tributária travada com o objetivo de atrair a instalação dessas fábricas, estados oferecem descontos na cobrança de impostos dessas companhias, majoritariamente multinacionais com matriz instalada fora do Brasil.
Em São Paulo, que concentra parcela expressiva do parque industrial do país, a renúncia fiscal prevista pelo estado em 2021 para o setor automotivo é de R$ 343 milhões.
Crise provocada pela pandemia
A indústria automobilística vive uma crise provocada pela pandemia da Covid-19, que derrubou a venda de veículos no país. As vendas iniciaram processo de recuperação no segundo semestre de 2020, mas terminaram o acumulado do ano em queda.
Os emplacamentos de veículos leves e pesados caíram 26,2% em 2020 na comparação com 2019, segundo dados do Renavam (Registro Nacional de Veículos Automotores). O resultado foi melhor do que o esperado pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
A baixa mais recente do setor, com impacto relevante sobre o mercado nacional e sobre os empregos, foi anunciada pela Ford nesta segunda (11). A montadora informou que, depois de um século em atuação no país, vai encerrar todas as atividades fabris no Brasil ainda neste ano.
O número de demissões pode chegar a 5.000 no país e na Argentina, mas o fim da produção dos veículos no Brasil também traz impacto negativo para o restante da cadeia, com empresas que hoje funcionam para atender demandas da Ford.
Serão fechadas as fábricas instaladas na Bahia, em São Paulo e no Ceará. Em 2019, a Ford já havia fechado uma fábrica em São Bernardo do Campo (grande São Paulo).
Incentivos fiscais
Os incentivos fiscais a montadoras são criticados por economistas e, nesta terça-feira (12), viraram alvo do presidente Jair Bolsonaro.
“Mas o que a Ford quer? Faltou à Ford dizer a verdade, querem subsídios. Vocês querem que continue dando R$ 20 bilhões para eles como fizeram nos últimos anos -dinheiro de vocês, impostos de vocês- para fabricar carros aqui? Não, perdeu a concorrência, lamento”, declarou o presidente, na saída do Palácio da Alvorada.
A Receita Federal não confirma o número apresentado pelo presidente e diz que não calcula a renúncia fiscal concedida a contribuintes específicos.
Além da Receita, a Folha pediu dados específicos de incentivos repassados à Ford em São Paulo, Ceará e Bahia. O único a fornecer a informação foi a Bahia, que afirma ter somado uma renúncia de R$ 948 milhões entre 2018 e 2020 para manter o funcionamento da fábrica da companhia no estado.
Com informações da Folha de S. Paulo
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