
Esta semana, um novo foco de calor do incêndio que consome o Pantanal brasileiro desde o dia 1º de agosto foi encontrado nas proximidades do maior refúgio de araras-azuis do mundo. O incêndio na fazenda São Francisco do Perigara, no Mato Grosso, ocorreu após uma aparente trégua nas queimadas, o que torna real a ameaça à sobrevivência da espécie. As chamas destruíram praticamente toda a vegetação nativa da propriedade, que serve de habitat e fornece alimentos para as aves.
A maior preocupação das autoridades ambientais e de entidades de pesquisa e proteção, neste momento, é preservar a área usada por araras-azuis e outros papagaios para dormir. O dormitório é uma concentração de palmeiras localizada na sede da propriedade rural, onde centenas de aves se reúnem nos fins de tarde para pernoitar. O espaço foi cercado e protegido há mais de 60 anos pela família proprietária da fazenda.
“Na segunda (17), foi mais calmo, mas no fim do dia recebemos a informação de que um novo foco de incêndio foi encontrado em uma mata que já havia sido queimada antes. No Pantanal, às vezes um tronco pega fogo por dias e as chamas podem voltar. O dormitório está protegido, mas temos que manter a vigilância pois o fogo não para enquanto não tiver uma chuva forte”, disse a bióloga Neiva Guedes, presidente do Instituto Arara Azul.
De acordo com o Corpo de Bombeiros, na terça-feira (18) ainda existiam focos de calor na fazenda São Francisco do Perigara e no entorno dela também. Os dados foram obtidos por meio de imagens do satélite NPP, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Sem alimentos
Fortemente atingida, a área próxima à reserva das aves concentra cerca de 15% das araras do Pantanal. A morte da vegetação no local compromete a alimentação dos animais. Elas costumam passar o dia a seguir o gado criado de forma extensiva na fazenda. Os bovinos comem os frutos das palmeiras acuri e bocaiúva e descartam a castanha, que servem de alimento para as araras.
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As aves já sofriam com a falta de alimentos antes mesmo do início das queimadas. Com poucas chuvas, faltava água e os animais estavam magros. Na fazenda São Francisco do Perigara, há um tanque para o gado e as araras beberem água e ele estava seco desde maio.
Investigação
Na última segunda-feira (17), a Secretaria de Segurança Pública do Mato Grosso deu início a uma operação policial para investigar a ocorrência de crimes ambientais no Pantanal, como incêndios florestais e queimadas irregulares.
Há a suspeita de que os incêndios têm sido provocados por pessoas que vão pescar na região e fazem fogueira para acampamento ou que usam fumaça para extrair mel de abelhas, perdem o controle e o fogo se alastra pela região.
Seca
O Pantanal enfrenta a mais severa estiagem desde a década de 1990. Apesar de ser típica a redução no volume de chuvas entre julho a outubro, o Serviço Geológico do Brasil do Brasil (CPRM) observou na primeira semana de agosto que as chuvas têm ocorrido significativamente abaixo do normal nos últimos meses.
“O pessoal na região também usa tocar fogo no campo para a pastagem brotar novamente. Como este ano choveu pouco, o Pantanal não encheu, então a vegetação está seca e virou combustível. Tinha mais de 20 anos que não havia uma queimada como essa”, afirmou Neiva Guedes.
Meio ambiente e Bolsonaro
A situação sobre o que ocorre no Pantanal coloca ainda mais pressão sobre o governo de Jair Bolsonaro (sem partido). Acusado de má gestão ambiental também na Amazônia, há consenso que faltou organização e competência também para lidar com o bioma.
Na, o Diário Oficial publicou a exoneração do coronel Homero Siqueira, que estava à frente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), um dos órgãos do sistema de vigilância e fiscalização das florestas. A decisão foi tomada pelo ministro Ricardo Salles em função do descontrole das queimadas no Pantanal. Siqueira seguiu a fórmula comum na gestão de Bolsonaro de trocar técnicos por militares em cargos do instituto que cuida das reservas nacionais, dizem seus críticos.
Quem conhece o Pantanal diz que faltou se antecipar aos fatos. “As ações precisam começar mais cedo. Só foram tomadas de forma tardia em 2020, quando os números [de queimadas] já estavam altos. Uma lentidão fatal para o bioma”, afirma Júlio Sampaio, que coordena o programa Cerrado Pantanal no grupo ambientalista WWF-Brasil. Ele cita o decreto federal que proibiu o uso do fogo no manejo das propriedades, publicado apenas este ano.
Com informações da Revista Época e El País
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