
Motivo do cancelamento do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro: o caixa da pasta está zerado. A notícia, dada pelo secretário de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal, Bartolomeu Rodrigues, o Bartô, foi um ‘balde de água fria’ não só para produtores, atores e diretores, mas também para espectadores do evento que tem 55 anos de tradição.
“Esta é uma notícia que a gente não gosta de dar. O Festival de Cinema de Brasília, que é tombado pelo patrimônio histórico da cidade, este ano não vai acontecer”, lamentou Bartolomeu em entrevista ao canal do Correio Brazilense no YouTube.
Em 2020 seria realizada a 53ª edição do festival, previsto para acontecer de forma online, em outubro. Contudo, houve contingenciamento de recursos pela Secretaria de Economia por conta da pandemia e o orçamento da Cultura, de R$ 3 milhões, segundo Bartô, deve ser utilizado nas ações de enfrentamento ao novo coronavírus.
“Com o orçamento contingenciado, ficamos sem um tostão furado para realizá-lo. Já comuniquei ao Grupo de Trabalho que há duas semanas se encarregou do planejamento, que infelizmente iremos cancelar o Festival”, acrescentou.
De acordo com o secretário, foram iniciadas conversas com plataformas de streaming como Netflix, para a exibição dos filmes. Os organizadores também avaliavam a possibilidade da transmissão do evento pelo telão do Cine Drive-In, para participantes que não tivessem acesso às plataformas escolhidas.
“Estávamos, é certo, muito animados e com possibilidade de realizarmos um festival totalmente diferenciado, instigando, inovador, fazendo jus à sua tradição”, afirmou.
A Secretaria de Cultura deveria lançar os editais para convocar os interessados na disputa e estabelecer regras de participação, “Porém, com o orçamento contingenciado, ficamos sem um tostão furado para realizá-lo”, afirmou o secretário.
O que diz o setor de audiovisual do DF sobre o cancelamento
Em nota, o setor de audiovisual do Distrito Federal afirmou classificou de mais um “boicote” a decisão da secretaria de cancelar o evento, que segundo o grupo “sofre mais uma tentativa de desmonte alegando falta de verba para seu financiamento”.
“Isso só aconteceu durante a ditadura militar, nos anos de 1972, 1973 e 1974″, disse Dacia Ibiapina, professora de audiovisual da Universidade de Brasília (UnB).
Leia íntegra da nota do setor de audiovisual do DF:
“Após a edição catastrófica de 2019, quando o Governo do Distrito Federal tentou censurar falas no 52º Festival Brasília de Cinema Brasileiro, o evento sofre mais uma tentativa de desmonte alegando falta de verba para seu financiamento. O atual secretário de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal, Bartolomeu Rodrigues, o Bartô, decidiu cancelar, neste ano, o Festival de Cinema de Brasília, alegando que recursos, embora previstos em orçamento, foram contingenciados pela Secretaria de Economia por causa do impacto da crise do novo coronavírus.
O Festival de Cinema de Brasília do Cinema Brasileiro é o mais antigo festival do gênero e um dos poucos dedicados exclusivamente ao cinema nacional. Ocorre anualmente em Brasília, no histórico Cine Brasília. Ele não é exclusivamente financiado pelo GDF mas também recebe apoio de várias grandes empresas via leis de incentivo. Sendo facilmente cancelada após a declaração de confirmação de sua realização semanas antes em reunião com várias associações, é notório que não há nenhum esforço para que a edição seja realizada, nem mesmo em um formato mais enxuto do ponto de vista financeiro. Outro ponto levantado pelo movimento cultural é que ao realizar o festival haveria uma dinamização do setor e distribuição de recursos em cachês de seleção e prêmios a serem distribuídos de forma local e nacional, ou seja, o festival poderia sim estar colaborando no impacto da crise que atinge principalmente o mercado cultural e não ser remanejado para fins desconhecidos ou outros setores.
Dacia Ibiapina, realizadora e professora de audiovisual da Universidade de Brasília, afirma: “O FBCB é a principal vitrine do cinema brasileiro e congrega anualmente em Brasília os filmes mais importantes e mais instigantes do nosso cinema com seus diretores, atores, equipes técnicas. É um festival político e não pode deixar de ser, já que ocorre na capital federal. 2020 promete.
Com a pandemia do COVID 19, certamente vai se discutir no FBCB 2020 os impactos da referida pandemia no cinema e no audiovisual, além das políticas públicas de fomento ao cinema e ao audiovisual, ou a falta que elas fazem, durante o governo Jair Bolsonaro, marcadas pelo desmonte da Ancine e do Fundo Setorial do Audiovisual. Desde 1965, quando foi criado o FBCB, somente foi cancelado durante a ditadura militar, nos anos de 1972, 1973 e 1974. Há poucos dias o secretario de cultura afirmou publicamente “jamais permitiria que o FBCB fosse cancelado, sobretudo no contexto atual… isso só ocorreu durante a ditadura militar”. O sonho de todo cineasta do DF e de todo país é ter um filme exibido no FBCB. Uma garantia de que o filme será visto e discutido nacionalmente e até mesmo no exterior, tendo em vista que por aqui passam durante o FBCB curadores dos festivais mais importantes do Brasil e do mundo”.
Várias foram as proposições para se realizar o Festival em tempos de pandemia, com adoção de práticas internacionais de distanciamento e assepsia, sessões ao ar-livre, momentos semi-presenciais, além do eventual caminho online.
O descaso com o cinema nacional se reafirma mais uma vez com a falta de articulação política e sistemático desmonte de todas as plataformas de debates para mercado audiovisual. Em anos mais recentes, o FBCB promove também um ambiente de mercado, onde empresas nacionais e internacionais comparecem para ver e adquirir direitos de exibição de filmes, séries e outros produtos/obras audiovisuais.
O Festival Brasília do Cinema Brasileiro sempre foi ambiente de grande importância para cinema nacional e não pode ser cancelado.”