
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou em sua conta no Twitter que estará amanhã, quinta-feira (11) em Alcântara (MA). O motivo da viagem seria a entrega de cerca de 200 títulos de propriedade rural no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), que segundo o mandatário estão pendentes desde a década de 1980.
A viagem, no entanto, tem um objetivo claro: é mais um passo para efetivar o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST), pacto firmado entre Brasil e Estados Unidos, em 2019, que visa o lançamento de foguetes do CLA e foi promulgado em fevereiro de 2020. O AST prevê a expansão da base e pode resultar na remoção de 2 mil quilombolas de 27 comunidades, que ocupam o local há três séculos.
Para barrar essa medida, o deputado federal Bira do Pindaré (PSB-MA), presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Comunidades Quilombolas, ingressou na Justiça Federal em maio de 2020.
Graças à iniciativa do socialista, o processo de remoção das comunidades quilombolas que vivem na área da Base de Alcântara, no Maranhão, foi suspenso por meio de uma liminar. A proibição da retirada das 800 famílias segue em vigor até que seja cumprida uma reivindicação legal e antiga: a consulta prévia, livre e informada das comunidades afetadas, como determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Reação socialista
No que diz respeito à entrega dos títulos de propriedade para a comunidade de Alcântara, Pindaré recordou que a entrega dos títulos é um direito antigo dos moradores da região e já estava previsto ainda na época da implantação da estrutura em território maranhense.
“Esses títulos são para agrovilas, que representam os povoados que foram expulsos de seus territórios, quando a Base foi implantada, em 1983. Portanto, há quase 40 anos estas pessoas esperam por essa titulação, que foi prometida pelo governo militar na época da implantação da Base de Alcântara e somente agora está sendo anunciando”, salientou Bira do Pindaré, destacando a urgência da revogação da Resolução nº 11/2020, medida assinada pelo Chefe do Executivo que autoriza o planejamento da expulsão de outras 800 famílias que serão atingidas pela expansão da Base.
“Hoje está em discussão o acordo entre o Brasil e os EUA. E aqui, quando eu votei, contrário ao Acordo, tive uma posição muito clara em defesa dos quilombolas. Hoje esta discussão está lá nos Estados Unidos da América. Por isso que o Bolsonaro está indo para Alcântara, para tentar fazer uma média, coisa para inglês ver… O que eu queria ver mesmo era revogando a Resolução nº 11 , porque esta foi assinada pelo seu governo, autorizando a expulsão de comunidades quilombolas em Alcântara. Não vamos aceitar isso, vamos denunciar, vamos mobilizar e a população maranhense vai acompanhar cada passo dessa situação. Tudo o que nós queremos é que o povo maranhense e o povo quilombola sejam respeitados nos seus direitos e na sua dignidade. A convivência entre as comunidades quilombolas e a Base de Alcântara é perfeitamente compatível, mas é preciso respeito aos direitos que estão na Constituição, e é isso que esperamos da autoridade máxima do país”, afirmou.
Em fala ao Socialismo Criativo, o parlamentar também mencionou o descumprimento da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina que governos realizem consulta prévia com as comunidades originárias sobre decisões administrativas e legislativas capazes de afetar suas vidas e seus direitos.
Além do descumprimento do tratado internacional, outras polêmicas relacionas à implantação da Base são a ausência de estudos de impacto socioambiental, a garantia constitucional dos quilombolas às suas terras tradicionais, ratificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e a incongruência da efetivação de qualquer remoção durante a pandemia causada pelo coronavírus.
Deselegância
Até o momento, o chefe do Executivo não convidou o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), para a cerimônia. Apesar da deselegância, Jair Bolsonaro não se privou de solicitar ao governo maranhense auxílio da Polícia Militar para a segurança durante a estadia no município.
Dossiê entregue a Biden
A visita de Bolsonaro ainda ocorre uma semana após o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e membros do alto escalão do novo governo receberem um dossiê que pede o fim de qualquer relação política com o Brasil enquanto Jair Bolsonaro estiver na Presidência, segundo reportagem da BBC News Brasil.
Leia também: Investidores estrangeiros criticam ação do governo na proteção da Amazônia
A iniciativa da U.S. Network for Democracy in Brazil foi endossado por mais de 100 acadêmicos de universidades como Harvard, Brown e Columbia, além de organizações como a Friends of the Earth, nos EUA, e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), no Brasil. O documento também foi revisado pela deputada Susan Wild, do comitê de Relações Internacionais, e Raul Grijalva, presidente do comitê de Recursos Naturais.