
Em um intervalo de oito dias, a jornalista sul matogrossense, Súzan Benites, 31, viu toda sua família morrer vítima do coronavirus. Sua mãe, Rosineide Nara, foi a primeira a não resistir às complicações causadas pela doença. Em seguida, seu único irmão, Rafael Benites, também se tornou mais uma vítima da pandemia. Na madrugada do último sábado (20), foi a vez de Súzan se despedir de seu pai, Atanacildo Nara.
“Este lar era feito de quatro colunas que sustentavam um teto. Em uma semana, três colunas foram arrancadas sem nenhum aviso prévio. Eu me pergunto: como uma única coluna vai sustentar este teto?”, desabafou ela nas redes sociais.
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Também em seu perfil do Facebook, a repórter falou sobre sua tristeza e do quão repentinas foram as perdas.
“Não existe lição, compreensão ou justificativa para um sofrimento tão grande. Há 15 dias, eu tinha um lar de muito amor, parceria, cumplicidade, planos, projetos, e hoje eu tenho nada. A única certeza que eu tenho é que fomos muito felizes juntos e seremos nós quatro para toda a eternidade” e seguiu, “Não resta nada de mim, porque eu não existo sem vocês. Espero mesmo encontrá-los em breve. A dor é sufocante, mas meu amor ainda é muito maior”, lamentou ela.
Enquanto sofria a morte de seus parentes, a repórter também temia perder seu namorado, Bruno Nascimento, que passou 11 dias internado com a doença e recebeu alta neste domingo (21). A família confirmou que estava infectada em 4 de março. Segundo Súzan, todos tinham muito medo da doença e seguiam as recomendações sanitárias.
“Meus pais, todos nós, na verdade, sempre tivemos muito medo da Covid. Desde o primeiro momento, paramos de fazer tudo. Nós não recebemos mais nenhuma visita e inclusive tinha muita gente brava porque passamos Natal e Ano Novo só nós em casa. A única pessoa que colocava o pé aqui dentro era o Bruno [namorado], porque me levava ao trabalho e era a única pessoa que jantava conosco todos os dias”, disse ela ao G1.
Mais perdas
Súzan também encarou as perdas da pandemia no seu ambiente de trabalho. Há algumas semanas, seu colega, o fotojornalista do Correio do Estado, Valdenir Rezende, faleceu deixando dois filhos, também fotógrafos.
As homenagens feitas para Rezende pelos profissionais de comunicação do estado foram acompanhadas de um pedido de mais respeito aos profissionais que têm feito a cobertura da situação caótica na qual o país se encontra. Inspirados nas atitudes do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que inúmeras vezes agrediu verbalmente, ameaçou e minimizou jornalistas, pessoas têm abordado esses profissionais para proferir ofensas.
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Na última semana, um cinegrafista, que prefere não ter o nome divulgado por motivos de segurança, recebeu pontapés e foi golpeado com um capacete de moto ao filmar imagens de um protesto contra medidas de isolamento em Minas Gerais.
“Estou com medo. Tenho família, trabalho na rua todos os dias. Me identifiquei como jornalista, como sempre faço, embora ali seja uma via pública e eles estivessem na porta de um quartel militar. Eu só queria reportar. Não compreendo por que eles não queriam dar visibilidade àquela manifestação”, desabafou ele à revista Época.
Como este, muitos outros casos acontecem com uma frequência cada vez maior desde o início da pandemia. Também em Minas Gerais, um homem agrediu e quebrou o equipamento do jornalista Robson Panzera, que fazia imagens de uma escola para ilustrar uma reportagem sobre o aumentos de casos da Covid-19 no local. O agressor tentou justificar a ação se dizendo “cansado de ver a TV espalhar terror”. Para Robson, o trabalho é exatamente o oposto disso.
“A gente está trabalhando, saindo de casa, para informar, para que as pessoas fiquem mais seguras e tranquilas. Tem que dar um basta [nessas agressões], é inaceitável. A gente está contaminado por uma polarização, onde os lados são muito agressivos e extremistas. ‘Olho para aquilo que eu acredito e não existe mais nenhuma verdade em volta’”, disse Robson à Folha de São Paulo.