Há 30 anos um grupo de 27 mulheres chegava a Câmara dos Deputados para exercer seu mandato de deputadas constituintes. Mal sabiam elas que enfrentariam uma estrutura institucional e política consolidada no machismo. Por outro lado, mal sabiam os homens que estavam diante de um grupo de mulheres que revolucionariam a forma de fazer política.
O documentário ELAS QUE LUTAM narra a história das mulheres que movimentam as estruturas de poder na Câmara dos Deputados há 30 anos, desde as constituintes até as parlamentares recém-eleitas; traçando uma linha histórica dos direitos conquistados.
Esse filme traz histórias de constituintes como a Benedita da Silva (PT-RJ) e Lídice da Mata (PSB-BA); conta como as deputadas aprovaram projetos importantes, em especial a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, relatadas, respectivamente, pela Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Maria do Rosário (PT-RS); e como as mulheres se organizaram para vencer barreiras e se organizar supra partidariamente.
O documentário também conta como a deputada Soraya Santos (PL-RJ), uma das maiores articuladoras da bancada feminina e responsável pelo planejamento estratégico da Secretaria da Mulher (que garantiu em 4 anos mais matérias aprovadas sobre pauta feminina do que nos últimos 50 anos), foi eleita para a 1ª Secretaria da Câmara dos Deputados, o segundo cargo mais importante da Casa e que nunca foi ocupado antes por uma mulher.
A Erika Kokay (PT-DF) também participa do filme e fala sobre a vivência de ser mulher parlamentar na Câmara dos Deputados. Junto com outras deputadas e com a advogada especialista em Direito Eleitoral, Danielle Gruneich, Kokay fala sobre a importância de aumentar a participação feminina na política através de políticas afirmativas, como as cotas de participação na campanha e a reserva de recursos e tempo de propaganda eleitoral.
Constituintes

Apelidadas de forma jocosa como “bancada do batom”, essas mulheres se apropriaram do apelido e uniram forças para garantir a igualdade expressa entre homens e mulheres na constituição.
Antes, na Constituição de 1967, o capítulo sobre Direitos e Garantias estava quase no final da Carta Maior, lá pelo artigo 150, e trazia apenas a expressão “Todos são iguais perante a lei, sem distinção, de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. O preconceito de raça será punido pela lei”. As deputadas conseguiram trazer o capítulo logo para o começo da Carta Magna e deixar expresso que, além da igualdade geral, “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”.
Isso pode parecer pouco, mas se traduziu, mais a frente, em uma reforma do Código Civil que trouxe mais independência para as mulheres. Garantias como não precisar de autorização do marido para comprar e vender carros ou imóveis. Ou ainda excluir a possibilidade do marido ou pai de uma mulher retirar uma denúncia feita por ela na delegacia.
A luta das constituintes garantiu os alicerces para diversas vitórias das mulheres nos anos seguintes. Direitos como proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos; ou ainda a igualdade de direitos na sociedade conjugal viraram garantias constitucionais.
Mas esse enfrentamento passou por obstáculos fortes, como machismo, assédios e falta de estrutura. Elas sequer tinham banheiro no plenário da Câmara. Só havia espaço para homens.
Participação feminina
A partir da atuação das constituintes, cada vez mais mulheres participaram do processo eleitoral. Ao longo das legislaturas, mais deputadas foram eleitas e, ao mesmo tempo, mais propostas de leis foram apresentadas, em especial sobre temas relacionados ao direito feminino, economia do cuidado, saúde e seguridade social.
A atuação suprapartidária e a mobilização em grupo permitiu que elas alcançassem um desempenho melhor do que os homens, mesmo representando pouco menos de 10% dos parlamentares, em cada legislatura.
Em média, cada mulher apresentou 17 projetos de lei durante o intervalo de um mandato (4 anos) e conseguiu aprovar três propostas. Cada homem, por sua vez, apresentou, em média, 12 projetos e aprovou apenas um.
Quando segmentados de acordo com o tema da proposta, descobre-se que as mulheres são responsáveis por 7 em cada 10 leis sobre tema feminino nos últimos 30 anos. Quando se trata de saúde da mulher, as deputadas foram autoras ou relatoras de 90% de todas as propostas que viraram lei no período. As deputadas criaram 37% das leis sobre educação, 25% das normas sobre finanças, 40% a respeito de infância e 50% das leis sobre cultura.
Cotas
Os resultados da participação feminina no parlamento são nítidos e o principal desafio é aumentar a bancada.
Segundo o Mapa Mulheres na Política 2019 – relatório da Organização das Nações Unidas e da União Interparlamentar divulgado em março de 2019 – no ranking de representatividade feminina no Parlamento, o Brasil ocupa a posição 134 de 193 países pesquisados, com 15% de participação de mulheres.
Nas eleições de 2018, foram eleitas 77 deputadas federais em um total de 513 cadeiras na Câmara, e somente 12 senadoras entre os 81 eleitos.
Para garantir melhores condições para candidaturas femininas, o Tribunal Superior Eleitoral aprovou, por meio de consulta, uma resolução que dispõe sobre a reserva de recursos proporcional ao volume de candidaturas de cada gênero, com o mínimo de 30%. Na prática, isso significa que se um partido tem 30% de candidatas mulheres, elas têm direito a mesma proporção em recurso financeiro para campanha e em tempo de propaganda eleitoral em rádio e televisão.
O entendimento dos ministros foi firmado em consonância com o que foi estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 15 de março de 2018, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5617.
No mesmo julgamento, o Supremo também determinou a destinação de pelo menos 30% dos recursos do Fundo Partidário às campanhas de candidatas. O entendimento do STF foi estendido à Resolução TSE nº 23.607, em seu artigo 19, parágrafo 3º.
O dispositivo da resolução da Corte Eleitoral também determina que os recursos do Fundo Partidário devem ser aplicados “na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, criados e mantidos pela secretaria da mulher do respectivo partido político”.
No caso de não existir a secretaria, os programas deverão ser mantidos por instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política, “conforme percentual que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária, observado o mínimo de 5% do total”.
Podcast ELAS QUE LUTAM
Além do documentário, há um podcast homônimo com comentários femininos sobre como a atuação das mulheres no parlamento se traduz para aquelas que vivem fora da realidade política, na vida cotidiana.
Os episódios programados trarão também as entrevistas completas com as parlamentares, incluindo trechos inéditos do filme.