
A decisão da Justiça do Rio de Janeiro que deu foro privilegiado ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) na investigação sobre ‘rachadinhas’ repercutiu entre parlamentares nesta quinta-sexta (26). Após o nono recurso, a defesa do primogênito do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) conseguiu que o caso fosse enviado à 2ª Instância do Tribunal de Justiça, alegando que Flávio já tinha direito ao benefício na época em que foi aberta a apuração por ser deputado estadual.
Procuradores do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) consideraram, no entanto, que a decisão está em desacordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Segundo os promotores, desde 1999 o STF aboliu a manutenção do foro quando o mandato eleitoral termina. Eles também citaram que, em maio de 2018, o STF também decidiu que parlamentares só têm direito ao foro privilegiado por infrações cometidas no exercício do mandato.
O argumento foi lembrado pelo líder do PSB na Câmara, deputado Alessandro Molon (RJ). “A decisão do TJ-RJ de levar o processo de Flávio Bolsonaro para a 2ª instância aumenta o alcance do foro privilegiado. Isso contraria decisão do plenário do STF, que deve ser cumprida. Espero que o MP-RJ entre com Reclamação no STF para que a decisão seja rapidamente derrubada”, disse.
‘Dois pesos duas medidas?’
Para o deputado Camilo Capiberibe (PSB-AC), o encaminhamento escancarou o esquema de privilégios concedidos a apenas a um grupo político. Pelas redes sociais, ele resgatou o episódio que levou à prisão do presidente Lula e questionou:
“Dois pesos duas medidas? Decisão do TJ-RJ, concedendo foro privilegiado ao senador Flavio Bolsonaro, é a restauração patrocinada por Jair Bolsonaro do padrão pré-Lava Jato de tratamento aos poderosos no Brasil e confirma: punições da era petista foram pontos fora da curva”.
‘Porcaria’
Resgatando um vídeo em que o presidente critica, ao lado do filho, o uso do foro, Marcelo Freixo (PSOL-RJ) denunciou o modus operandi da família. “Jair Bolsonaro era contra o foro privilegiado… até mexerem com o filho dele. Que nome a gente dá a isso, minha gente?”. No vídeo, Bolsonaro diz que “não quer essa ‘porcaria’ de privilégio”.
No Senado, o líder da oposição na Casa, Randolfe Rodrigues (Rede-AC), chamou a decisão de ‘derrapagem’. “Considerando a jurisprudência do STF, a menos que roubar salário de assessor seja ‘função inerente ao cargo’ de deputado, o TJ-RJ derrapou feio, ao salvar o pescoço de Flávio Bolsonaro: vamos ao STF acabar com essa farsa!”, prometeu, anunciando que entrará com uma ação para barrar a deliberação.
‘Farsa’
A deputada Érika Kokay (PT-DF) também não poupou na crítica. “Em 2018, a família Bolsonaro fazia defesa enfática contra o foro privilegiado. Em 2020, Flávio Bolsonaro, enrolado com milícias, recorre ao foro privilegiado para ganhar tempo nas investigações por corrupção e lavagem de dinheiro. O clã Bolsonaro é uma farsa!”.
‘É o faz de conta’
A sentença se tornou assunto mesmo entre os ministro da Corte. “Não há menor dúvida de que a decisão do Tribunal de Justiça é totalmente diversa da decisão de pronunciamentos reiterados do Supremo. Não há a menor dúvida de que não observaram a doutrina do Supremo. É o Brasil. É o faz de conta. Faz de conta que o Supremo decidiu isso, mas eu entendo de outra forma e aí se toca. Cada cabeça uma sentença”, disse o ministro do STF, Marco Aurélio Mello.
Defesas do passado
O vídeo divulgado por Bolsonaro durante a campanha eleitoral não foi o único aceno do atual mandatário e sua família contra a decisões semelhantes.
Em 2017, Flavio Bolsonaro usou as redes sociais para se posicionar sobre o tema. Na época da publicação, a nomeação do ex-presidente Lula para o Ministério da Casa Civil, posteriormente derrubada, livraria o ex-presidente do alcance de Sérgio Moro. “Mudar a lei por uma ocasião de momento me cheira a golpe. O povo pode enxergar uma manobra para que Lula tente alcançar foro privilegiado”, publicou em suas redes.
Outro crítico ao privilégio em 2017 foi o filho mais novo do presidente, Eduardo. No Twitter, ele declarou ser a favor do fim da prerrogativa e comemorou quando o mandato de Geraldo Alckmin (PSDB) como governador de São Paulo chegou ao fim para que o tucano fosse submetido ao julgamento de Moro.
Com informações do Estadão.