
Conhecidos por serem os primeiros “salvadores” de startups em estágio inicial, os investidores-anjo estão Vulneráveis a condições macroeconômicas desfavoráveis. Trazendo dinheiro e conhecimento para as empresas, esses investidores foram mais conservadores em 2020: foram desembolsados R$ 856 milhões para esse tipo de investimento no ano passado, recuo de 20% em relação ao ano anterior. Ocorreu também uma diminuição de 15% do número de investidores dessa categoria, totalizando 6,9 mil no Brasil, segundo dados divulgados em julho pela organização sem fins lucrativos Anjos do Brasil.
“Se houver menos anjos, haverá um estrangulamento de startups nessa base, limitando o crescimento do ecossistema. Podemos perder startups que poderiam estar surgindo, mas que não avançam por falta de capital.”
Cassio Spina
O fundador e presidente da Anjos do Brasil, Cassio Spina, explicou em entrevista para o Estadão que apesar de haver sinais de recuperação em 2021, o cenário brasileiro ainda não é favorável às startups que estão começando
“A experiência internacional mostra que, para poder desenvolver a atividade de investimento em startups, tem de haver políticas públicas de incentivo. No Brasil, isso não existe”.
Cassio Spina
Baixo investimento em startups em 2020
Segundo Spina, existem dois perfis de investidor: o proativo, que é o que busca ativamente por uma carteira, e o passivo, aquele executivo que é procurado para investir e ajudar. O especialista percebeu e as pesquisas mostram que, enquanto os proativos tiveram um ligeiro crescimento em 2020, os passivos tiveram uma queda bastante significativa.
Isso aconteceu em função da pandemia, principalmente nos primeiros meses, quando houve impacto forte na economia, com bolsas caindo e economia parando. Depois disso retomaram os investimentos, mas alguns investidores sofreram impacto em seus próprios negócios e priorizaram os recursos antes de investir novamente.
Esses dados destoam do que aconteceu em um ano em que o aporte total em startups do País chegou ao recorde de US$ 3,5 bilhões. Spina explicou que os fundos de investimento captam o recurso antes e investem depois.
“Assim que foi retomada a economia depois do baque inicial da pandemia, os fundos começaram a reinvestir o que estava planejado. Já o investidor-anjo usa capital próprio e é mais vulnerável à situação macroeconômica. Conheço investidor-anjo que é dono de uma rede própria de sapatos e que não iria voltar a investir até que o negócio se restabelecesse.”
Cassio Spina
De acordo com o especialista, tivemos uma recuperação e a perspectiva é positiva em 2021. Para ele, o problema é que, em 2020, o Brasil também aumentou a defasagem em relação a investimentos em startups globalmente. A experiência internacional mostra que, para poder desenvolver a atividade de investimento em startup, tem de ter políticas públicas de incentivo. Spina afirma que no Brasil, isso não há.
Consequências do baixo investimento-anjo
Cassio Spina esclarece que se houver menos anjos, vai haver um estrangulamento de startups na base, limitando o crescimento do ecossistema. Vamos perder oportunidades. Ele explica ainda que o governo pode resolver esse gargalo estimulando e equiparando o tratamento tributário dado a investimentos em startups
“Hoje, por exemplo, para investir em startups no Brasil, você é tributado como renda fixa. Isso não tem o menor sentido, uma vez que startups têm um risco mais elevado e não têm liquidez. Ao investir numa empresa da Bolsa de Valores, se ela tiver valor abaixo de R$ 700 milhões, existe isenção total. Se for acima, no mínimo há como compensar as perdas com os ganhos, que é o razoável. E, quando se investe em startups, não há como compensar.”
Cassio Spina
Ele acredita que o governo afasta possíveis novos investidores do mercado de inovação com essa política de tratamento tributário desigual. Precisaríamos que uma parte desses 3 milhões de pessoas da B3 viesse para o investimento-anjo.
Situação das startups no Brasil
Spina pontua que todos os BRICS, menos o Brasil, fazem equiparação tributária. A África do Sul tem uma política de permitir com que o investidor compense até 100% do volume investido. É o governo dizendo: “Invista em uma startup e eu devolvo esse dinheiro para você”, porque entendem que isso fomenta a economia, não aumenta a renúncia fiscal e gera arrecadação. O Brasil está com uma defasagem de 20 anos.
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Spina alerta que a falta de diversidade de gênero e de raça não é algo específico do Brasil, e sim global. Estudos comprovam que, além de dar oportunidades, a diversidade traz valor e melhora resultados. Por exemplo, empresas com empreendedoras do sexo feminino têm taxas de sucesso maiores do que em companhias com conselhos totalmente masculinos, porque traz outra visão e identidades complementares.
Existe pouca diversidade regional no Brasil e isso se refletiu nos dados da pesquisa, segundo Spina.
“Existe concentração regional, mas o bacana é que conseguimos ter investidores em todas as regiões do Brasil. Claro, são quantidades pequenas, mas temos. Temos criado grupos regionais para reunir investidores locais e mostrar e fomentar o empreendedorismo”, concluiu.
Startups e a Autorreforma
Em sua porposta de Autorreforma, o PSB defende o investimento e o estímulo a novas formas de economia. Segundo os socialistas, estimular joint ventures, associações e empresas nacionais com grandes investimentos nas indústrias criativas, de modo a torná-las competitivas nacional e internacionalmente se faz necessário.
“O Estado precisa estimular os talentos individuais e coletivos, financiando sem burocracia e com os riscos naturais, os coletivos culturais, as startups, os inventores individuais, os profissionais criativos, em todas os setores da economia e da cultura.”
Autorreforma PSB