
A compra de vacinas contra a Covid-19 será o alvo da semana na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado Federal que apura a condução da pandemia pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido) e a aplicação de recursos federais por estados, Distrito Federal e municípios no enfrentamento à crise sanitária.
Na agenda da CPI da Pandemia esta semana está previsto, na terça-feira (11), o depoimento do presidente da Agência Nacional de Vigilância Santitária (Anvisa), Antonio Barra Torres. Ele deve falar sobre o processo de liberação de vacinas contra o coronavírus.
A convocação de Barra Torres é resultado de quatro requerimentos apresentados à CPI. O primeiro deles, do senador Angelo Coronel (PSD-BA), questiona o fato de a Anvisa ter negado autorização à vacina Sputnik V, produzida pelo laboratório russo Gamaleya. “O processo que levou à não liberação pela Anvisa da Sputnik V foi envolto em polêmicas e supostas pressões de ambos os lados. Tal processo merece ser apreciado por esta CPI e por isso é imperiosa a convocação”, argumenta Coronel.
Os outros três requerimentos foram apresentados pelos senadores Eduardo Girão (Podemos-CE), Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI da Pandemia, e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente do colegiado. Para Randolfe, Barra Torres precisa explicar por que houve “atraso e omissão” na compra de imunizantes. “Só foi possível chegar a essa situação catastrófica por conta dos inúmeros e sucessivos erros e omissões do governo no enfrentamento da pandemia da covid-19 no Brasil”, justifica.
Na quarta-feira (12), o colegiado escuta o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten. Na quinta (13), serão ouvidos os dois representantes da Pfizer no Brasil: Marta Diez, que assumiu o cargo em 2021, e seu antecessor, Carlos Murillo; e o representante da União Química, Fernando Marques, sobre o processo de registro da vacina russa Sputnik V.
‘Gabinete do ódio’ e falta de campanha de vacinação
O bloco que une senadores oposicionistas e independentes na CPI da Pandemia vai avançar sobre dois pontos ainda inexplorados na comissão: o papel do “gabinete do ódio”, estrutura de apoio ao Palácio do Planalto nas redes sociais, na difusão de notícias falsas sobre a pandemia; e o impacto da falta de uma campanha clara de conscientização sobre os riscos do coronavírus no agravamento da doença no Brasil.
O depoimento de Wajngarten é considerado central pelos parlamentares para investigar ambas as frentes. A demora do governo em assinar o contrato para a compra de vacinas da Pfizer também será um assunto, já que Wajngarten atribuiu a falha ao Ministério da Saúde, então comandado por Eduardo Pazuello. O plano dos senadores é aprofundar o tema quando o próprio ex-ministro comparecer, na semana que vem.
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CPI da Pandemia no encalço de fakenews
Integrantes do grupo de oposição e independente afirmam que dados e eventuais contradições do depoimento de Wajngarten podem abrir caminho para que a CPI alcance o “gabinete do ódio”, cujos principais integrantes seriam os assessores Tércio Arnaud Thomaz, José Matheus Sales Gomes e Mateus Matos Diniz.
Segundo o jornal O Globo, a comissão quer saber as empresas de publicidade pagas pelo governo e a destinação desses recursos. Os parlamentares suspeitam que os repasses contribuíram para a propagação de notícias falsas, atrasando o país no combate à pandemia, e que os servidores que compõem o grupo estariam por trás da difusão de mensagens.
Com o mesmo objetivo, já foi solicitado o compartilhamento de dados da CPI das Fake News e do inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga o tema. A comunicação do governo também já é alvo de uma auditoria no Tribunal de Contas da União (TCU). Senadores vão apurar por que a gestão Bolsonaro não criou campanhas para ensinar a população a se proteger do vírus.
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Repasses federais para estados e municípios
Senadores governistas querem para desviar o foco do colegiado em direção às suspeitas de desvios de recursos e falhas na gestão de estados e municípios. Os parlamentares já conseguiram emplacar requerimentos de informação sobre questões estaduais, incluindo requisições à Controladoria-Geral da União (CGU) e à Procuradoria-Geral da República (PGR), e tiveram aval para convocar autoridades do Amazonas a depor.
A ampliação do foco da CPI foi um pedido expresso de Bolsonaro. O ato de criação da comissão, no entanto, restringe o trabalho dela à apuração sobre o destino de recursos federais repassados aos demais entes da federação. O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), e seu relator, Renan Calheiros (MDB-AL), já deixaram claro que ela não tem competência para investigar estados e municípios.
A aposta dos governistas, porém, é aprovar mais convocações de integrantes de governos estaduais, para centrar neles as discussões e dividir o peso político. Apesar da vitória no pedido para convocar o secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo, e um ex-secretário-executivo local, os depoimentos ainda não foram marcados — e há histórico de várias comissões que aprovam convocações, mas não as efetivam.
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“Consultório do Crime” defende Bolsonaro
Segundo o colunista da Folha de S.Paulo Celso Rocha de Barros, doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, Bolsonaro é defendido na CPI da Pandemia pelo o que ele chama de “Consultório do Crime”, um grupo de senadores que buscam tumultuar a investigação mentindo sobre medicina. Seus principais representantes são Eduardo Girão (Podemos-CE) e Luiz Carlos Heinze (PP-RS).
De acordo com o sociólogo, “Bolsonaro usou a cloroquina como artifício para minimizar os riscos da pandemia e mandar o povo brasileiro morrer na rua”. Diz em sua coluna que “Girão e Heinze mentem sobre a eficácia da cloroquina, mas o curandeirismo presidencial não é o principal crime que tentam acobertar”.
Ernesto Araújo e o esforço por cloroquina
O depoimento do ex-chanceler Ernesto Araújo foi adiado para a próxima semana. Ele seria ouvido na próxima quinta (13). Reportagem da Folha mostra que ele mobilizou o aparato diplomático do Brasil para garantir fornecimento de cloroquina ao país, mesmo após a Organização Mundial de Saúde (OMS) ter interrompido testes clínicos com a droga e depois de associações médicas terem alertado para a ineficácia e o risco de efeitos colaterais.
A corrida do Itamaraty atrás da cloroquina começou pouco depois de Bolsonaro falar em “possível cura para a doença” em suas redes sociais, em 21 de março do ano passado.
Queiroga pode voltar à CPI da Pandemia
O presidente da CPI da Pandemia, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou neste domingo (9) em entrevista à GloboNews que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, pode ser chamado a prestar um novo depoimento.
Queiroga prestou depoimento à CPI na semana passada por cerca de oito horas. No entanto, integrantes da comissão ficaram incomodados com o fato de Queiroga ter evitado responder perguntas sobre alguns temas.
Para que Queiroga compareça novamente à comissão, um integrante da CPI deve apresentar um requerimento, e o plenário deve votá-lo e aprová-lo. Se aprovada nova convocação, Queiroga será obrigado a comparecer a uma sessão, em data a ser definida.
Pazuello será tratado como civil em depoimento
Segundo o blog do Octavio Guedes, no G1, o ex-ministro da saúde Eduardo Pazuello será tratado pelos senadores como civil e não será chamado pela patente militar de general.
A estratégia, segundo o vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), é deixar bem claro que o colegiado quer mostrar a atuação dele enquanto ministro – um cargo civil – e isolar o Exército.
Como o blog havia informado, o próprio Exército fez chegar ao general a informação de que ele será desmentido caso venha dizer que a cumpriu uma missão autorizada e determinada pela Força ao aceitar sua ida ao ministério.
Rodrigues declarou nesta segunda (10), que Pazuello será preso caso descumpra “compromisso de falar a verdade na CPI”. Enquanto isso, o general elabora uma nova estratégia: conseguir um habeas corpus no STF para adiar o depoimento marcado para o próximo dia 19. A movimentação foi classificada como “artifício jurídico” por Randolfe.
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Com informações do jornal O Globo, Folha de S. Paulo, G1, GloboNews, Agência Senado e Brasil 247