
A farra com dinheiro público promovido pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) para agradar aliados tomou novas proporções com o orçamento secreto. Enquanto municípios fazem malabarismo com as contas para dar conta de manter medicamentos essenciais à população, outras cidades do mesmo porte recebem até o dobro dos valores destinados à saúde.
Tudo graças às tais emendas de relator, sem regras claras e usadas em larga escala para beneficiar eleitoralmente aliados governistas.
Reportagem do jornal O Globo mostra como funciona na prática o esquema. Em agosto do ano passado, o então líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), foi à Petrolina com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, inaugurar um mamógrafo.
Acontece que Petrolina, localizada a cerca de 700 quilômetros do Recife, é reduto do clã Coelho e foi a cidade que mais recebeu recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) via emenda parlamentar. Para se ter uma ideia, os valores são maiores do que os destinados à capital, Recife, quatro vezes maior que Petrolina.
Ainda de acordo com a reportagem, à época o prefeito da cidade era o filho de Bezerra, Miguel Coelho (União). Foram R$ R$ 13 milhões transferidos ao município por meio do Fundo Nacional de Saúde (FNS), do total de R$ 65 milhões do orçamento secreto destinadas no ano passado por Bezerra à área de saúde.
O jornal conseguiu identificar que dos R$ 13 milhões enviados à Petrolina, $ 4,5 milhões para a inauguração de um centro cirúrgico e da UTI do hospital Dom Tomás, que é administrado pela Associação Petrolinense de Amparo à Maternidade e à Infância (Apami). Acontece que quem comanda a entidade é Augusto Coelho, tio avô do ex-prefeito.
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“Nunca vivenciamos essa discrepância nos repasses como nos últimos anos. Municípios ganhando quase duas vezes mais do que outros que têm a mesma população. No caso das emendas, o único critério é político”, disse o presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Pernambuco (Cosems), José Edson de Souza, ao jornal.
‘O nome disso é corrupção’
A deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) critica duramente a distribuição de dinheiro público por meio do orçamento secreto.
“Orçamento secreto é um novo jeitinho que o governo inventou para fazer o toma la, da cá e garantir apoio no Congresso. São BILHÕES de reais em dinheiro público sendo usados sem critérios, de forma desigual entre os parlamentares e sem transparência. Isso ai tem nome: corrupção!”, critica.
Privilégios para aliados bolsonaristas
O privilégio dos aliados bolsonaristas segue Brasil fora. Em Campo Formoso (BA), a 400 quilômetros de Salvador, foi o segundo município que mais recebeu emendas do orçamento secreto repassadas via FNS ao estado. Com população de pouco mais de 70 mil pessoas, o volume desses recursos ficou atrás apenas da capital, que tem 2,9 milhões de habitantes.
Dessa vez, o benevolente foi o deputado bolsonarista Elmar Nascimento (União-BA). Irmão do prefeito do município, Elmo Nascimento, repassou R$ 29,9 milhões para Campo Formoso, em 2021.
O dinheiro seria usado para a construção de um segundo hospital municipal. Mas até o momento, a licitação sequer foi realizada.
Para se ter uma noção da discrepância, a cidade de Senhor do Bonfim, tem 79,8 mil habitantes, e recebeu R$ 6,3 milhões de emendas do orçamento secreto e conta com unidades de saúde lotadas sem médicos suficientes.
De acordo com o Jornal Nacional, da TV Globo, os repasses mensais do SUS para o único hospital de Campo Formoso são insuficientes para cobrir os gastos e o prejuízo mensal é de R$ 300 mil.
Falta de vacina
Enquanto esbanja num canto, o Ministério da Saúde de Bolsonaro decidiu reduzir o envio médio de 1,2 milhão de doses por mês da vacina BCG para 500 mil doses mensais nos próximos sete meses. A vacina é dada aos bebês nos primeiros dias de vida e protege contra tuberculose.
De acordo com a BBC Brasil, a pasta solicitou ‘uso racional desta vacina por este período’. A alegação é que há dificuldade para adquirir o imunizante. Muito embora o Brasil tenha uma fábrica que poderia dar conta da demanda. Mas que, desde 2016, tem sido interditada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e mantém o fornecimento intermitente.