
Líderes e dirigentes de partidos do Centrão e aliados do governo fizeram apelo ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para que modere o tom com relação à existência de fraude nas urnas eletrônicas e a defesa do voto impresso. O mandatário fez uma live na quinta-feira (29) com o maior ataque às urnas eletrônicas. A avaliação é que Bolsonaro precisa parar de flertar com ameaças golpistas sob pena de perder mais em popularidade por causa da pecha de radical.
O presidente se comprometeu com congressistas e ministros, inclusive Ciro Nogueira, recém-nomeado chefe para comandar a Casa Civil, a melhorar o discurso. A live, na qual o mandatário não apresentou provas de fraudes, foi considerada patética por ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF).
A transmissão ao vivo teria sido ainda pior, disseram aliados de Bolsonaro, não fosse a intervenção do Centrão. O objetivo do mandatário, afirmaram ministros, era atacar com mais contundência os integrantes do Supremo.
Reformulação do discurso de Bolsonaro
Líderes partidários aliados do governo no Congresso disseram que o objetivo é buscar junto ao presidente a reformulação do discurso. A aposta é que Ciro conseguirá convencer Bolsonaro a virar a chave e falar para a população de que é seguro votar e deixar de lado a tese das fraudes nas urnas.
Esta não será a primeira vez que dirigentes do Centrão apelam a Bolsonaro para que ele recue em declarações radicais. O presidente costuma variar em suas falas. Ora soa mais moderado, ora volta atacar Congresso, STF e minimizar a pandemia.
Segundo ministros, Bolsonaro deverá participar da reunião entre os três Poderes que está sendo articulada pelo presidente do Supremo, ministro Luiz Fux. Fux irá telefonar na segunda-feira (2) a Bolsonaro e aos presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), respectivamente, para marcar a data do encontro.
A reunião ocorreria no início deste mês, mas teve de ser cancelada após a internação de Bolsonaro em decorrência de uma obstrução intestinal.
Bolsonaro não apresenta provas de fraude eleitoral
Nesta quinta (29), após três anos denunciando supostas fraudes nas eleições brasileiras, Bolsonaro prometia apresentar durante a live o que ele chamava de provas, mas trouxe apenas teorias que circulam há anos na internet e que já foram desmentidas anteriormente. Ao longo da fala, Bolsonaro mudou o discurso e admitiu que não pode comprovar se as eleições foram ou não fraudadas.
“Não tem como se comprovar que as eleições não foram ou foram fraudadas. São indícios. Crime se desvenda com vários indícios”, disse.
Ao final da exposição, Bolsonaro foi questionado por jornalistas se havia mostrado suspeitas ou provas. Respondeu: “Suspeitas, fortíssimas. As provas você consegue com a somatória de indícios. Apresentamos um montão de indícios aqui”.
Durante a apresentação, foram veiculados vídeos divulgados na internet que buscam transmitir a mensagem de que é possível fraudar o código-fonte para computar o voto de um candidato para o outro.
Multa de R$500 mil a Bolsonaro
Em reação às falas de Bolsonaro, o partido Rede Sustentabilidade (Rede) pediu ao STF que multe o presidente em R$ 500 mil a cada nova manifestação inverídica sobre existência de fraudes eleitorais. O partido solicitou que o valor seja descontado do patrimônio de Bolsonaro e destinado para o controle da pandemia da Covid-19.
A Rede já havia ingressado com um mandado de segurança no início de julho no qual solicitava que o presidente apresentasse provas das suspeitas levantadas contra as eleições. À época, o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, deu dez dias para o mandatário explicar as afirmações.
Em outra frente, o presidente da Câmara disse nesta sexta-feira (30) não ver chances de a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso ser aprovada na comissão especial da Casa. Na avaliação de Lira, o texto não terá apoio suficiente para chegar ao plenário.
“A questão do voto impresso está tramitando na comissão especial, o resultado da comissão impactará se esse assunto vem ao plenário ou não. Na minha visão, tudo indica que não”.
Arthur Lira
Na avaliação de líderes do Centrão, só daqui um tempo será possível ver se Bolsonaro cumprirá mesmo o prometido de moderar o discurso. Mesmo assim, caso ele continue com o habitual tom radical, congressistas estão otimistas quanto à articulação do governo com o Congresso, graças à entrada de Ciro na Casa Civil. O mais importante são as demandas de negociaçoes por aprovação de matérias serem atendidas.
Além disso, deputados e senadores que pretendem apoiar a reeleição de Bolsonaro querem sobretudo que saia logo a reformulação do Bolsa Família e que sejam lançadas medidas de estímulo à economia. Só assim, avaliam, Bolsonaro conseguirá recuperar um pouco da popularidade que perdeu.
Repercussão internacional
O fiasco da live de Bolsonaro da quinta-feira (29), na qual ele não conseguiu mostrar qualquer elemento minimamente concreto de fraudes em urnas eletrônicas como havia prometido, também teve repercussão fora do Brasil.
A âncora da CNN International, Becky Anderson, abriu entrevista com João Doria (PSDB) nesta sexta-feira (30) perguntando sobre a live. “Another big mistake of mister Bolsonaro”, respondeu o governador, falando em grande erro do presidente.
Com informações do jornal Folha de S. Paulo