Em entrevista ao Poder em Foco, Djamila fala, entre outros assuntos, sobre a desumanização de pessoas negras, heranças racistas coloniais, veladas ou não, até hoje praticadas no país, e explica conceitos como ‘lugar de fala’ e o uso das expressões mulato, negro, preto e pardo

A filósofa e escritora Djamila Ribeiro afirmou estar “claro que a comoção em torno do assassinato de George Floyd precisava existir”, porém, ela diz que o brasileiro reage mais ao racismo praticado em outros países do que no próprio Brasil. Em entrevista ao jornalista Fernando Rodrigues, apresentador do Poder em Foco, canal do Poder 360 no YouTube, Djamila revelou que a cada 23 minutos 1 jovem negro é assassinado no país.
Para ela, a onda de manifestações antirracistas que se propagou ao redor do mundo após a morte de George Floyd, asfixiado por um policial branco nos Estados Unidos, em nada se compara ao Brasil, onde “há uma naturalização sobre mortes de corpos negros e fatos periférico”.
A mestre em filosofia política pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) lembrou que duas semanas antes do assassinato de Floyd (19/05), o adolescente João Pedro Matos Pinto, 14 anos, foi baleado e morto durante operação das polícias Federal e Civil no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro.
No programa, Djamila analisa que o conjunto atual de atos antirracistas nos EUA é o segundo maior desde a luta por direitos civis naquele país (1955 a 1968). A diferença, diz ela, está em uma maior participação da “branquitude crítica” (categoria filosófica da teoria racial crítica) nas manifestações.
“A gente entende que é um país racista e que ali existe uma série de questões, mas talvez as pessoas brancas estejam discutindo mais essas questões de branquitude crítica [indivíduo branco que desaprova publicamente o racismo]”. O Brasil dificulta muito por conta dessa visão romântica de uma pseudo-harmonia das raças”, pondera.
Djamila cita a ativista negra Beatriz Nascimento (1942-1995) ao falar do mito da democracia racial, dizendo que um “emaranhado de sutilezas” foi criado para dizer que o Brasil não era uma país racista, mas sim um lugar onde todos vivem harmoniosamente.
“Isso dificultou, de fato, uma maior consciência no Brasil. É importante dizer que os movimentos negros estão, historicamente, denunciando essa resistência em debater o sistema. O Brasil só foi considerar a escravidão como um crime contra a humanidade em 2001, na conferência de Durban [África do Sul] . A gente percebe que as coisas no Brasil foram muito difíceis“, diz.
Coordenadora da série de publicações “Feminismos Plurais”, a autora de livros como “Quem tem medo do feminismo negro” (2018) e o recente, “Pequeno manual antirracista” (2019), falou sobre conceitos como ‘lugar de fala’ e a diferenciação entre raça e cor da pele.
A escritora disse ser urgente o debate sobre o tema da segurança pública no Brasil. Perguntada sobre que avaliação faz do presidente da Fundação Cultural Palmares, Sergio Camargo, ela afirmou que pessoas como ele devem combatidas. “Esse senhor não nos representa”.
“Infelizmente, nós temos uma segurança pública pautada na repressão, na criminalização dos territórios periféricos. Essa guerra às drogas que nada mais é guerra às populações negras e periféricas. É necessário discutir a descriminalização das drogas, desmilitarização das polícias. O papel do Estado nesses espaços não pode ser só o papel da repressão. Tem que ser o papel de criar políticas públicas nas áreas de educação, moradia, saneamento básico. Então, esse debate da segurança pública é urgente”, afirma.
Pode assistir íntegra da entrevista no You Tube, pelo canal do Poder em Foco, ou ler o relato completo da entrevista de Djamila Ribeiro clicando aqui.