
Não é de hoje que o presidente Jair Bolsonaro (PL) flerta com ideologias fascistas e nazistas. O discurso nacionalista, o ódio à esquerda e o apelo à violência guardam certas semelhanças com o governo mussoliniano, por exemplo, além das diversas denúncias de ligações do presidente com grupos neonazistas.
A antropóloga e pesquisadora da PUC de Campinas Adriana Dias, que há anos rastreia pela internet grupos extremistas de ultradireita que atuam no Brasil, encontrou uma carta de Bolsonaro, que na época era deputado federal, datada de 2004, dirigida a neonazistas de um site que propagavam tal ideologia, retirado do ar em 2006: o Econac.
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Em 2015, Bolsonaro apareceu em foto ao lado de um “sósia” de Hitler após audiência pública na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro convocada para debater o projeto Escola Sem Partido, defendido pelo ex-capitão. Por decisão da Comissão de Educação da Câmara, Marco Antônio Santos, o “Hitler”, foi impedido de falar por estar trajado igual ao ditador nazista, mas isso não o impediu de posar ao lado do hoje presidente da República.
Além da foto, Santos se filiou ao PSC em 2016 – partido que, na época, abrigava Jair Bolsonaro e seu clã – para concorrer à vereança e chegou a receber doações do hoje senador Flávio Bolsonaro – que concorreu à Prefeitura da capital carioca na ocasião.
Bolsonaro e o modelo fascista moderno
Mas o neofascismo de Bolsonaro não é a repetição do fascismo dos anos 1930: é um fenômeno novo, com ares modernistas e características do século 21. Por exemplo, não assume a forma de uma ditadura policial, mas “respeita” algumas formas democráticas: eleições, pseudo pluralismo partidário, existência de um Parlamento, etc.
Naturalmente, trata, na medida do possível, de limitar ao máximo estas liberdades democráticas, com medidas autoritárias e repressivas. Tampouco se apoia em tropas de choque armadas, como eram as SA alemãs ou o Fascio italiano. No neofascismo, há uma mobilização de vários grupos paramilitares de caráter neofascista, mas nunca chegam a tomar um caráter de massas, como os grupos de milicianos que gravitam em torno de Bolsonaro e seus filhos.
Outro aspecto especifico do neofascismo bolsonarista é o obscurantismo, o desprezo pela ciência, em aliança com seus apoiadores incondicionais, os setores mais retrógrados do neopentecostalismo evangélico. Esta atitude, digna do terraplanismo, não tem equivalente em outros regimes autoritários, mesmo os que têm por ideologia o fundamentalismo religioso. Max Weber distinguia religião, baseada em princípios éticos, e magia, a crença nos poderes sobrenaturais do sacerdote. No caso de Bolsonaro e seus amigos pastores neopentecostais (Malafaia, Edir Macedo, etc.) se trata mesmo de magia ou de superstição: parar a epidemia com “orações” e “jejuns”…
O combate da esquerda e das forças populares brasileiras contra o neofascismo ainda esta no começo; será preciso mais do que passeatas e protestos para derrotar esta formação política teratológica.
Não há nenhuma receita mágica para combater a extrema-direita neofascista. O combate ao neofascismo deve se inspirar nas tradições antifascistas do passado, mas também inovar, a fim de responder às novas formas desse fenômeno. O movimento antifascista só será eficaz e crível se for motivado por forças situadas fora do consenso neoliberal dominante.
O sistema capitalista, sobretudo nos períodos de crise, produz e reproduz fenômenos como o fascismo, o racismo, os golpes de Estado e as ditaduras militares. A raiz desses fenômenos é sistêmica e a alternativa tem de ser radical, antissistêmica. Isto é, um socialismo libertário e ecológico que supere os limites dos movimentos socialistas do século passado – o compromisso socialdemocrata com o sistema e a degeneração burocrática do chamado “socialismo real” –, mas recupera as tradições revolucionárias brasileiras, de Zumbi dos Palmares e Tiradentes à Carlos Marighella e Chico Mendes.
Com informações do artigo de Michael Löwy, em A Terra é Redonda