
Com águas ancestrais armazenadas por até 250 mil anos, o aquífero Guarani tem sido cada vez mais utilizado para o abastecimento público. Com 1,2 milhão de Km² – área duas vezes maior que a França, sendo 840 mil Km² em território brasileiro, a reserva subterrânea já é responsável por abastecer pelo menos 15 milhões de pessoas no Brasil – a maioria no estado de São Paulo.
Diante de crises hídricas cada vez mais frequentes no estado, o aquífero passou a ser uma fonte estável em tempos de mudanças climáticas. Dados do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) de São Paulo mostram que em 2021, 564 novos poços de extração de água do aquífero foram autorizados.
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Os números foram revelados em matéria da BBC. Atualmente existem 3.200 poços autorizados a operar no território paulista do aquífero e outros 224 processos em tramitação.
O número de outorgas vem crescendo anualmente desde 2014, quando São Paulo enfrentou uma das maiores crises hídricas da história.
Os municípios abastecidos exclusivamente pelo aquífero Guarani, como a cidade de Ribeirão Preto, não sentiram os efeitos da seca em 2021. Sertãozinho e Matão também são localidades que dependem hoje 100% da reserva subterrânea.
São José do Rio Preto, São Carlos, Bauru e Franca, já têm o Guarani como uma de suas principais fontes hídricas. São Paulo ocupa 13% da extensão do aquífero e responde por 70% de toda a água extraída da reserva. Os dados são da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Entre especialistas a exploração do aquífero tem gerado preocupações, principalmente pelo bombeamento intenso e pela possibilidade de contaminação das águas.
Águas ancestrais

O aquífero se estende também por outros sete estados brasileiros, além de São Paulo: Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Além da Argentina, Paraguai e Uruguai.
A reserva regula os rios da bacia do Paraná, que o sobrepõe em grande parte, e tem águas majoritariamente potáveis. Quase toda a extensão de água está confinada por rochas basálticas, que chegam a mil metros de espessura.
A maior parte das águas que formam o aquífero são provenientes das chuvas que infiltram, ao longo de milênios, os lençóis freáticos em trechos em que a reserva está mais próxima da superfície.
São nessas áreas, mais próximas da superfície, que a instalação de poços costuma ser mais simples. Porém, existem hoje tecnologias que permitem a exploração mesmo de águas mais profundas.
Nesses trechos confinados, as águas chegam a estar armazenadas por mais de 250 mil anos.
De acordo com a reportagem da BBC, a cidade de São José do Rio Preto é onde essas águas antiquíssimas, também conhecidas como “águas fósseis”, saem das torneiras.
Entre as maiores cidades abastecidas pelo Guarani está Ribeirão Preto, que tem 711 mil habitantes e todos dependem exclusivamente do aquífero.
A cidade conta com 118 poços tubulares, que extraem água de profundidades superiores a 200 metros e os bombeiam para reservatórios.
No entanto, o uso intenso das águas fez com que os níveis dos poços caíssem. Assim, a prefeitura passou a limitar a abertura de novos poços.
Mesmo com as restrições e os cuidados, Ribeirão foi uma das poucas cidades paulistas que não precisou racionar água em 2021.
Em 2010, a Agência Nacional de Águas (ANA) divulgou um relatório que revela que 52% dos municípios brasileiros eram abastecidos total ou parcialmente por águas subterrâneas. Em São Paulo, o índice chegava a 70%.
De acordo com o IBGE, em 2017, existem 1,03 milhão de propriedades rurais dispõem de pelo menos um poço tubular.

Contaminação de aquíferos no Brasil

Uma das principais preocupações com a utilização cada vez maior do aquífero Guarani para o abastecimento de cidades e zonas rurais é a possibilidade de contaminação da reserva. No Brasil, existem dados que apontam a contaminação por esgotos em locais como Manaus, Belém e Maceió, onde está o aquífero Grande Amazônia.
Existem, ainda, casos de contaminação por rejeitos industriais, por exemplo, em São Paulo, onde autoridades precisaram proibir a escavação de poços e interditar outros que já existiam.
A Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental de São Paulo (Cetesb) estima que o estado tenha de 3 a 4 mil pontos de contaminação de aquíferos.
Em 2020, relatório divulgado pela Companhia, apontou que 23,9% das amostras coletas no Aquífero Guarani já apresentavam índices acima dos parâmetros para alumínio, bário, selênio e coliformes.
Apesar da tentativa de controle, o Brasil esbarra em um problema estrutural: a falta de dados sobre águas subterrâneas. Cerca de 10% dos poços tubulares do país são cadastrados, de acordo com estimativas.