
O professor Ricardo Antunes lança um olhar lúcido e realista sobre a tragédia de trabalhadores e trabalhadoras antes, durante e depois da pandemia da Covid-19. Em sua nova obra Coronavírus: o trabalho sob fogo cruzado (Boitempo, 2020) o sociólogo do trabalho parte da premissa da impossibilidade de o capitalismo ofertar algo que não contemple a destrutividade.
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No livro, Antunes ressalta a letal relação entre crise estrutural do capital, há tempos em curso, e contexto da atual emergência de saúde pública. Assim, soma-se a crise social à profunda crise política de consequências nefastas. O doutor em Geografia Fábio Coltro, professor colaborador do programa de mestrado em Administração da Universidade Estadual de Londrina (UEL), escreveu sobre a nova obra de Antunes para o Blog da Boitempo.
Precarização do trabalho se soma à Covid-19
Coltro comenta que no novo livro, Antunes salienta que no Brasil convivemos com a vil realidade da precarização do trabalho desde muito antes da pandemia da Covid-19. Ele cita que, em 2019, 40% da classe trabalhadora encontrava-se na informalidade e mais de 5 milhões de trabalhadores e trabalhadoras experimentavam as condições da chamada uberização do trabalho, proporcionada pelos aplicativos e plataformas digitais. Ainda assim, acreditavam serem privilegiados por essa nova “servidão”.
“Com a chegada da pandemia, que não foi repentina e nem sem ser antes amplamente anunciada, foi se configurando um “desenho societal ainda mais desolador”. Antunes questiona sobre o que esperar: o que esse sistema de metabolismo antissocial do capital tem a oferecer?”
Fábio Coltro
Hecatombe socioambiental
Coltro comenta que compartilha das inquietações de Antunes, as quais também concilia e dialoga com a hecatombe socioambiental em curso. “Não só Antunes, mas outros grandes nomes como Istvan Mészáros, John Bellamy Foster, David Harvey, Kohei Saito e Jason W. Moore, só para citar alguns, também relacionam as preocupações sociais, trabalhistas, ambientais e identitárias numa grande crítica ao capital”, reflete.
Antunes, escreve Coltro, retoma a ideia proposta por Karl Marx de que o sistema capitalista busca eternamente o acúmulo e expansão em busca da produção de mais capital. O resultado é sempre a destruição acentuada.
O livro analisa ainda os efeitos nefastos do sistema capitalista e do metabolismo antissocial do capital, principalmente aqui no Brasil. Antunes afirma ainda que a divisão sociossexual e racial do trabalho penaliza ainda mais as mulheres negras, submetidas de forma particular à violência e ao feminicídio.
Vida de trabalhadores não vale nada para o capital
Para Antunes, a vida das trabalhadoras e dos trabalhadores não vale muito para o capital. O autor demonstra como as discriminações de classe, gênero, etnia (a exemplo dos indígenas e refugiados) e raça, se expressam ainda mais durante a pandemia, submetendo todos e todas ao fogo cruzado.
Na obra, comenta Coltro, Antunes também fala sobre o dilema vivenciado pela classe trabalhadora durante a pandemia da Covid-19. Por um lado, o isolamento social que nem sempre é favorecido por um ambiente doméstico adequado para tal, e a quarentena, ambos necessários para que se evite a contaminação pelo coronavírus.
“Por outro, as urgências do desemprego, informalidade, intermitência, uberização, tercerização, subutilização, ou seja, da condição imposta a aqueles e aquelas “que não têm direitos sociais e que só recebem salário somente quando executam algum trabalho”. Tudo isso no momento em que o Brasil tem mais de 350 mil mortos pela Covid-19 e uma figura grotesca no comando presidencial.”
Fábio Coltro
Confira o artigo na íntegra aqui.
Com informações do Blog da Boitempo