
O Brasil iniciou 2021 com mais pessoas vivendo na extrema pobreza do que antes da pandemia e tem mais miseráveis que no começo da década passada, em 2011.
Os dados, divulgados neste domingo (31) pelo jornal Folha de S.Paulo, revelam uma projeção feita pela FGV Social de que, com o fim do auxílio emergencial, estabelecido pelo governo de Jair Bolsonaro em dezembro de 2020, 12,8% dos brasileiros passaram a viver com menos de R$ 246 ao mês (R$ 8,20 ao dia), linha de pobreza extrema calculada pela Fundação, a partir de dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (Pnads) Contínua e Covid-19.
27 milhões entregues à própria sorte
No total, segundo projeção da FGV Social, quase 27 milhões de pessoas estão nessa condição neste começo de ano – mais que a população da Austrália.
O aumento também foi significativo na comparação com o segundo semestre de 2020, quando o pagamento do auxílio emergencial a cerca de 55 milhões de brasileiros chegou a derrubar a pobreza extrema, em agosto, para 4,5% (9,4 milhões de pessoas) – o menor nível da série histórica. A taxa neste começo de década é maior que a do início da anterior (12,4%) e que a de 2019 (11%).
O efeito negativo da pandemia sobre a renda dos mais pobres já tenderia a ser prolongado levando-se em conta a recuperação difícil que o Brasil tem à frente (quase sem espaço no Orçamento público para novas rodadas de auxílio emergencial), o aumento das mortes pela Covid-19 e o atraso no planejamento da vacinação.
Perdas para os mais jovens
Mas, além do aumento da pobreza no presente, o estudo aponta que a pandemia deve impor perdas futuras de renda aos mais jovens, sobretudo os pobres, que acabaram perdendo boa parte do ano escolar de 2020. Em média, cada ano de ensino a mais chega a representar ganho de 15% no salário futuro; e 8% mais chance de conseguir um emprego.
Em 2020, no entanto, os alunos da rede pública tiveram a metade das atividades em relação a anos normais, segundo dados da FGV Social e das Pnads. A redução nas escolas privadas foi bem menor – o que implicará em aumento, nos próximos anos, da desigualdade entre ricos e pobres.
Fim do auxílio x Disparidades regionais
O aprofundamento das disparidades também se dará regionalmente. Em Santa Catarina, por exemplo, só 2% dos alunos de escolas públicas e privadas deixaram de receber material para atividades em casa na pandemia. No Pará, foram 42%.
No geral, os jovens, os sem escolaridade, os nordestinos e os negros foram os que mais perderam renda do trabalho na pandemia. Hoje, cerca de 35% dos jovens brasileiros nem trabalham nem estudam – os chamados “nem nem” eram 25% no final de 2014.
O aumento da taxa de pobreza complica o cenário. Como os pobres consomem toda a renda que recebem, o fato de um número significativo não estar trabalhando ou ganhando trava a aceleração do crescimento econômico.
Aumento da inflação e penalização dos mais pobres
Neste momento, a volta da incerteza sobre a plena reabertura da economia afetará sobretudo o setor de serviços, responsável por 2/3 do PIB e onde os pobres mais atuam.
Outro limitador da recuperação pela via do consumo das famílias – responsável por 65% do PIB – é o aumento da inflação, especialmente para os mais vulneráveis.
Em 2020, a inflação para as famílias com renda entre 1 e 2,5 salários mínimos atingiu 6,3%, segundo o IPC-C1 (Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1, da FGV). Dentro do índice, os preços dos alimentos dispararam 15,4%.
A mais cara cesta básica em 15 anos
Segundo cálculos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o valor da cesta básica em São Paulo em relação ao salário mínimo (R$ 1.100) é o maior em 15 anos o que compromete a capacidade de consumo das famílias.
A partir de critérios distintos, o economista Naercio Menezes, do Insper, também calcula que a taxa de pobreza neste começo de 2021 seja maior que a do fim de 2019.
Assim como Neri, ele prevê que o impacto da falta de aulas durante a pandemia vá ser significativo, capaz de reverter boa parte dos avanços na educação e na renda dos mais pobres nos últimos 20 anos.
Segundo seus cálculos, sem o auxílio emergencial no ano passado, os miseráveis teriam chegado a quase 20% dos brasileiros (42 milhões).
Com informações da Folha de S.Paulo
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