
Uma busca rápida no Google pelo nome do deputado federal Elias Vaz (PSB) apresenta 1.370 resultados que o associam às forças armadas em um intervalo de 0,33 segundos. Isso porque há um ano o parlamentar iniciou uma série de denúncias de irregularidades envolvendo compras superfaturadas de picanha, salmão e cerveja por parte de agrupamentos do Exército, Marinha e Aeronáutica.
Neste mês, o caso ganhou ainda mais notoriedade quando entre os itens inadequados adquiridos com dinheiro público estavam comprimidos de Viagra, próteses penianas e lubrificantes íntimos. As licitações, muitas delas com preços superfaturados e envolvendo empresas de fachada, buscavam realizar a compra de o que parecia a lista de compras de uma churrasco peculiar.
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A farra foi descoberta ainda em 2020, no auge da pandemia da Covid-19, o que para Elias Vaz trouxe ainda mais indignação. “Com essa lista de compras, as forças armadas pareciam estar comemorando, mas comemorando o que enquanto a população estava de luto com tantas mortes pelo coronavírus?”, questiona o parlamentar.
Para o socialista, um dos deveres mais importantes do parlamento é a fiscalização do Governo Federal. “Sempre encarei que como parlamentar tenho o dever de fiscalizar para saber se o dinheiro público recebe a destinação adequada, mas neste caso é ainda mais relevante trabalharmos para desmascarar um governo que está mergulhado em corrupção”, defende.
Segundo Elias, a investigação específica sobre as forças armadas ainda vai revelar muitas surpresas. “Temos muito por vir ainda, as denúncias já começaram a dar resultado. O TCU (Tribunal de Contas da União) já mandou suspender algumas compras como as de bacalhau e abriu para a fase de defesa das forças armadas.”
Já são mais de 30 processos abertos para investigar essas compras suspeitas. Além dos itens já listados existem ainda licitações para compra de sorvete e carvão. Tudo em grandes quantidades e com exigências questionáveis. “Nós encontramos processos licitatórios que exigiam a marca da cerveja e isso foi uma das primeiras coisas que nos chamou atenção e a partir daí passamos a fiscalizar com atenção”, lembra o deputado.
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Uma investigação que demanda tempo, afinal por uma questão de logística as compras nas forças armadas são realizadas isoladamente por cada unidade. Além da compra superfaturada de 35 mil comprimidos de Viagra e das 60 próteses penianas a R$ 3,5 milhões, os números alarmantes incluem ainda 12 mil kg de picanha a R$ 84 o quilo; 70 mil kg de músculo a R$ 45 e muitos outros.
Orçamentos feitos em computadores das forças armadas
O modus operandi das forças armadas para realizar essas compras incluem práticas descuidadas, que denunciam uma ideia de garantia da impunidade. Em um dos casos, no Rio de Janeiro, duas empresas de sorvete concorreram em uma licitação. Uma em nome da mãe e outra da filha, sendo que em uma busca simples na internet é possível descobrir que as duas empresas, pequenas, funcionam em uma única sorveteria.
Em outro caso, todas as empresas que concorreram em um processo licitatório fizeram o orçamento em um único computador. “Um computador localizado dentro das forças armadas”, enfatiza o deputado Elias Vaz. Ele relata que esses avanços nas investigações ocorreram após as denúncias.
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“São muitas irregularidades gritantes, como empresas ligadas a um ex-capitão do Exército que havia sido expulso justamente por fraudes em licitações e que agora tem mais de 50 milhões de contratos com as forças armadas para fornecimento de alimentos. Uma pessoa que foi condenada a 5 anos de reclusão pela Justiça Militar em 2019. É de causar muita indignação”, ressalta o parlamentar.
O deputado lembra que como alguns processos foram descentralizados para os Estados, as investigações devem revelar ainda muitas surpresas. “Acredito que os desdobramentos começam a surgir agora com as investigações do próprio TCU. Alguns processos foram arquivados, mas em outros as forças armadas já foram chamadas a se defender.”
“Eu não posso usar o meu Viagra, pô?”
A resposta irônica do vice-presidente da República, o general Hamilton Mourão (Republicanos), revela a maneira como o governo Bolsonaro lida com as denúncias de corrupção. A prática é focar nas polêmicas, escolher os aspectos a serem comentados, geralmente os menos relevantes, e esperar que as diversas denúncias de corrupção caiam no esquecimento.
“Ao comentar a questão do Viagra, por exemplo, a resposta das forças armadas e do próprio Jair Bolsonaro (PL) foi de que os comprimidos eram para hipertensão pulmonar, que é uma doença rara. Especialistas consultados foram enfáticos ao dizer que as dosagens adquiridas só servem mesmo para disfunção erétil. Porém, todo o governo ignorou as denúncias de superfaturamento, ou seja, uma resposta seletiva e polêmica até que tudo seja esquecido”, comenta Elias.
De polêmica em polêmica, o próprio presidente da República segue afirmando que em seu governo não há corrupção. “Essas denúncias não só mostram que existe muita corrupção no governo Bolsonaro, como escancara o mar de privilégios das forças armadas. Em um país que não tem dipirona no SUS, há dinheiro para comprar Viagra, lubrificantes íntimos e próteses penianas para o Exército é um absurdo. Não se trata de uma visão moralista, se trata de respeito a população.”
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E a certeza da impunidade faz com que as próprias forças armadas denunciem a corrupção. Na compra dos comprimidos para disfunção erétil, por exemplo, o Exército comprou a R$ 1,50 cada cápsula, enquanto a Marinha fez a mesma compra a R$ 3,65. “Ou seja, o próprio Exército revelou que a Marinha está superfaturando porque uma diferença de 150% já fala por si. Além do fato que a quantidade de comprimidos mais caros é maior, o que não dá nem para dizer que se trata de um desconto por compras em maior quantidade.”
Confira o vídeo com trechos da entrevista do deputado federal Elias Vaz: