
Mais de um ano após comemorar a doação de hidroxicloroquina pelos Estados Unidos e por uma farmacêutica para o uso contra a Covid-19, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) ainda estoca cerca de 2,1 milhões desses comprimidos em armazéns do Ministério da Saúde e do Exército e já avalia dar novo destino a eles.
Desde o fim do último ano, caiu o número de prefeituras que solicitaram o medicamento, sem eficácia comprovada para a Covid. Em 2021, houve só oito pedidos e há casos de cidades que tentam devolver unidades.
Cerca de 70% dos 3 milhões de unidades doadas ao Brasil seguem em estoque. Agora, a proposta é redistribuir esses medicamentos para uso nas indicações previstas em bula, como artrite e lúpus. Esse pedido já havia sido feito por gestores de saúde no ano passado, mas o ministério ainda buscava alternativas para uso dos remédios em pacientes com Covid-19.
Impulsionado pela promoção do tratamento feita por Donald Trump, ex-presidente dos EUA, e por por estudos preliminares, o governo Bolsonaro correu para acumular cloroquina e hidroxicloroquina nos primeiros meses da pandemia.
O Laboratório do Exército turbinou a produção de cloroquina, e doses já fabricadas pela Fiocruz para o programa de malária foram desviadas para o combate à Covid.
CPI investiga compra de hidroxicloroquina da Índia
Documentos entregues à CPI mostram ainda que o governo tentou comprar 5 milhões de doses da hidroxicloroquina da Índia, em abril, mas desistiu do negócio em outubro, quando já estocava o produto.
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Segundo informações entregues pela Saúde à CPI da Pandemia e concedidas pelo Exército via Lei de Acesso à Informação, há ainda 2,17 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina estocados. A maior parte (1,4 milhão) está em armazém do Ministério da Saúde. Já o Exército guardou cerca de 1 milhão dos remédios doados, dos quais ainda mantém ao menos 780 mil.
A droga doada ao Brasil ainda precisa ser fracionada em frascos menores, operação que reduz a validade do produto e deve ser custeada por quem pedir ao ministério o envio das doses.
Ministério da Saúde não confirmou estoque
O Ministério da Saúde não confirmou o estoque atual de doses, alegando que a informação é reservada, e disse que as orientações sobre a cloroquina estão sendo revistas. O Exército não disse para quais locais mandou o medicamento ineficaz contra a pandemia.
O ministério apontava que a hidroxicloroquina doada por Trump seria o trunfo do país para enfrentar a Covid a partir do segundo semestre de 2020. Antes disso, a pasta apostou na cloroquina feita em laboratórios públicos —cerca de 5,4 milhões de comprimidos foram distribuídos.
O ministro Marcelo Queiroga foi questionado pela CPI, em depoimentos de maio e junho, sobre se manterá a entrega dos medicamentos sem eficácia para a Covid pelo SUS.
Primeiro ele afirmou que não autorizou a distribuição dos medicamentos na sua gestão, que começou no fim de março. Mas dados da Saúde mostram que Presidente Prudente (SP) recebeu 100 mil unidades em 27 de abril. Já no depoimento deste mês, Queiroga disse que os remédios guardados poderiam ser usados para indicações em bula. “Tratamento da malária, tratamento de afecções reumáticas que está previsto para essas medicações. Esse é o destino”, afirmou.
Exército estoca cloroquina
O Exército também estoca cerca de 300 mil unidades de cloroquina, parte dos 3,2 milhões de comprimidos feitos no laboratório para a pandemia. A produção anterior da droga no órgão havia sido de 256 mil unidades, em 2017. Mesmo com a sobra dos dois medicamentos, o ministério pediu, em dezembro, para a Fiocruz entregar mais 750 mil doses de cloroquina.
Com informações da Folha de S.Paulo